As eleições europeias… E assim vai Portugal…
13-06-2014 - Carlos Ademar
Os tempos vão difíceis para a democracia, que Churchill definiu como o pior dos regimes, à excepção de todos os outros. A História demonstra-o, as democracias têm grandes dificuldades em conviver com períodos prolongados de crise económica, por conduzirem a retrocessos civilizacionais como os que alguns países da Europa vivem há anos.
Não por acaso, nas últimas eleições para o Parlamento Europeu, os partidos que tradicionalmente se vão alternando no poder, apresentaram uma queda acentuada face a outras eleições, fazendo emergir partidos alternativos com propostas extremistas onde, por exemplo, os emigrantes e as minorias são apontados como o demónio a abater. Também é de salientar nestas eleições, a enorme fragmentação dos votos por um vasto leque de partidos face ao habitual, o que criaria grandes dificuldades em termos da necessária estabilidade governativa, caso se tratasse de eleições legislativas.
No caso português, os três partidos do arco do poder, PS, PSD e CDS-PP, pela primeira vez na história da democracia apenas se aproximaram dos 60% dos votos, quando costumam superar facilmente os 80%. Além da fragmentação dos votos por partidos pequenos, emergiu o discurso populista de Marinho e Pinto, o antigo bastonário da Ordem dos Advogados, conseguindo que um partido, o MPT, que nunca se aproximou sequer do 1% dos votos em anteriores eleições, conseguisse desta feita fazer eleger dois deputados europeus e atingir os 7%. Outra particularidade deste acto eleitoral foi o facto de, com a excepção das eleições legislativas de 1985, em que surgiu o vendaval gerado pelo PRD – eleições ganhas pelo PSD com pouco menos de 30% -, nunca um partido vencedor havia conseguido uma percentagem tão baixa como a obtida pelo PS, que se quedou nos 31,5%. Também a coligação que apoia o actual Governo, PSD e CDS-PP, sofreu a maior derrota de sempre, ficando-se pelos 27,7%. Se os resultados da coligação se podem entender face ao programa de austeridade, quiçá excessivo, aplicado aos portugueses a ferro e fogo e sem anestesia, o fraco resultado do PS tem uma explicação mais complexa. Se por um lado o eleitorado quis dar a entender não se ter esquecido das responsabilidades que cabem ao partido da rosa pela actual situação económica, por outro quis registar a traço grosso que a liderança do PS não se tem conseguido impor como alternativa ao actual Governo.
Fossem estas eleições legislativas, em que estaria em jogo a formação de um novo governo, talvez o eleitorado não se tivesse dividido tanto e, por certo, concentraria os votos nos partidos que normalmente se alternam na liderança da política nacional. Porém, o que estava em causa era o Parlamento Europeu, algo distante, que, pensa-se, nada tem a ver com o nosso dia-a-dia. Neste ponto, também se pode tentar encontrar alguma explicação para a tradicional abstenção elevada que toca particularmente estas eleições, que, no entanto, a 25 de Maio atingiu a taxa recorde de 66% – dois terços dos eleitores.
Algo parece, contudo, indiscutível: os portugueses quiseram aproveitar estas eleições para mostrar um cartão amarelo aos partidos do arco do poder, sendo que ao PS lhe quiseram dizer que, para ser alternativa teria de repensar a sua liderança. Só assim se podem entender os 31,5% num contexto de tão enorme desgaste sofrido pelos partidos do Governo.
O povo falou através do voto e a maior derrota que PSD e CDS-PP tiveram em Portugal, acabou por passar para segundo plano, porque o Partido Socialista ficou a menos de quatro pontos de distância, desvantagem fácil de recuperar pela direita até às eleições legislativas de 2015, bastando um simples amaciar da austeridade e até, porque não, as habituais benesses eleitorais. Paradoxo da democracia, o partido vencedor entrou em pânico, apesar dos discursos e dos sorrisos, mais nervosos que vitoriosos, na noite eleitoral. As reações internas não se fizeram esperar e António Costa, o eterno putativo candidato a líder, avançou. Não faltaram as acusações de facadas nas costas vindas do interior do Partido, nem certas críticas de alguns analistas conotados com a direita, talvez porque, com ele na liderança, vejam mais distante a vitória das suas cores políticas nas eleições de 2015.
Por seu lado o Governo reagiu violentamente contra o Tribunal Constitucional como nunca se viu, como aliás nunca se vira um governo não conseguir pôr de pé um orçamento de Estado – e já lá vão três – sem que seja alvo de inconstitucionalidades. Os mais maquiavélicos defendem que o radicalizar de posições contra o TC, designadamente por parte de Passos Coelho, visa criar um clima de instabilidade que legitime, aos olhos dos portugueses, o pedido de demissão e a marcação de eleições antecipadas. Não é despiciendo nesta eventual estratégia, o momento de desnorte que se vive no PS, cujo ainda líder, António José Seguro, teimou pela originalidade de marcar eleições primárias para secretário-geral – algo que sempre recusara quando outros o propuseram -, apenas para finais de Setembro, arrastando a instabilidade no seio do partido charneira da oposição.
Vem aí o Mundial, o Verão, as férias…. E assim vai Portugal.
Carlos Ademar
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