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Incompetência e esbanjamento na Sonangol

09-11-2018 - Paulo Zua

Aos poucos, o presidente João Lourenço vai-se acomodando aos mesmos hábitos do seu predecessor: por exemplo, tornar a gestão estratégica e dos recursos estratégicos do país uma área dominada por consultores e aventureiros estrangeiros. Isto implica negligenciar ou ignorar a promoção e valorização do potencial dos quadros angolanos, uma atitude absolutamente prioritária e que deve ser implementada através do diálogo e da meritocracia.

O caso mais flagrante de desaproveitamento do potencial nacional em prol do estrangeiro é o despacho do presidente João Lourenço de 25 de Outubro de 2018, referente à contratação de uma empresa para prestar consultoria à Sonangol, trabalho pelo qual receberá um pagamento próximo dos 50 milhões de dólares. Neste despacho, o general Lourenço reconhece a necessidade urgente de se contratar uma empresa com experiência nos sectores de actividade do Grupo Sonangol, de modo a promover e implementar o seu processo de regeneração.

Para efectivar esta contratação milionária, será utilizado o procedimento de contratação simplificada.

Ora, a escolha do procedimento de contratação simplificada para um negócio no valor de 50 milhões de dólares nada mais revela do que falta de transparência, para não dizer mesmo que se trata de um procedimento ilegal.

No entanto, o mais importante neste momento é defender que a Sonangol e as instituições do Estado em geral têm de abandonar estes métodos duvidosos de contratação milionária de consultores externos. Se as lideranças das empresas e das instituições públicas não sabem como as regenerar, quem saberá?

Na realidade, são injustificáveis as razões para a Sonangol contratar consultores neste momento, quando o essencial da sua reestruturação foi já anunciado, aliás em consonância com muito do que defendemos no Maka Angola e noutros lugares.

Antes de mais, é preciso lembrar que a Sonangol gastou, ao longo dos últimos dez anos, centenas de milhões de dólares em consultorias externas, que deram já origem a variados estudos.

Para resumir, a reestruturação da Sonangol assenta em três pontos essenciais:

1. Proceder à privatização parcial da empresa em bolsa, de acordo com métodos transparentes e competitivos, para evitar as tentações oligárquicas de tipo russo.

2. Implementar a divisão entre a regulação do sector petrolífero e a exploração industrial.

3. Colocar o foco no “core business”, alienando activos excendentários ou encerrando actividades deficitárias.

Todos estes pontos foram anunciados recentemente, embora de forma assistemática, pelo ministro dos Petróleos ou pelo presidente do conselho de administração da Sonangol. Portanto, o trabalho essencial está feito. O que motiva agora a contratação de consultores externos? Trata-se de colmatar uma eventual incapacidade, incompetência ou preguiça do actual conselho de administração? Ou será para maximizar as mais-valias deste mesmo conselho de administração, que não encontra competências e valências críticas nos órgãos a si subordinados? Qual é a política de gestão de recursos humanos na Sonangol? Esta empresa estatal tem investido centenas de milhões de dólares na formação de centenas de quadros angolanos no Ocidente. Esses quadros tiveram aulas nocturnas diferenciadas ou aprenderam o mesmo que os seus pares ocidentais? O que pensam e o que fazem esses quadros? Já alguma vez se realizou uma conferência pública de quadros sobre a Sonangol? Porque não?

Além do mais, a existência de consultores externos e os gastos que isso acarretava foi uma das mais violentas críticas à gestão de Isabel dos Santos. Defendia-se que a Sonangol possuía quadros suficientes para implementar a sua própria reestruturação, sem necessitar do recurso permanente a consultores, que aliás seriam contraproducentes para a motivação e produtividade dos trabalhadores da empresa. Esta crítica à administração de Isabel dos Santos foi consensual e constituiu um dos pontos de ataque de Carlos Saturnino na famosa conferência de imprensa de Fevereiro de 2018, em que este arrasou a gestão da filha do antigo presidente.

Então agora Carlos Saturnino faz o mesmo que criticou em Isabel dos Santos, e pretende além disso ser aplaudido como bom gestor?

Uma outra questão tem a ver com a eficiência das consultoras. Contratar um especialista em determinada área para auxiliar um processo de reconversão é uma medida positiva e aconselhável. Um antigo PCA de uma empresa norte-americana pode ser uma mais-valia importante, pelos seus conhecimentos sobre produtividade e eficiência na gestão de uma empresa, do mesmo modo que um especialista em bolsa ou em processos de privatização também pode ser uma mais-valia. Isto é, pessoas especialmente qualificadas devem, efectivamente, ser contratadas para auxiliar a Sonangol.

O mesmo não se pode dizer acerca de empresas de consultoria com contratos milionários, que geralmente alcançam resultados muito inferiores ao esperado. Nestes casos, a consultoria acaba por se resumir ao envio de jovens estagiários inexperientes, cheios de teorias na cabeça mas com pouco conhecimento do terreno, e que portanto estragam mais do que consertam. Alguns desses jovens inexperientes e empregados pelas empresas de consultoria então ao serviço de Isabel dos Santos são angolanos. É evidente que a abertura de concursos públicos rigorosos para a contratação de quadros capazes teria dado emprego directo a alguns desses jovens, com menos custos para a Sonangol e muito mais vantagens a longo prazo.

Os problemas da Sonangol não se resolvem com exércitos de consultores, mas sim com decisões políticas arrojadas e a liderança necessária de quadros angolanos, obviamente recorrendo a apoio externo pontual e objectivo.

Com esta decisão de João Lourenço estamos perante um retrocesso, uma volta ao passado e aos métodos opacos e irracionais de gestão.

Só nos resta ver com preocupação mais uma contratação multimilionária de consultores para a Sonangol. Para que servirá afinal?

Fonte: Maka Angola

 

 

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