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O Manifesto e a Austeridade

28-03-2014 - Luís Alves de Fraga

Na minha carreira militar – começada aos treze anos de idade no Instituto dos Pupilos do Exército onde fui aluno até entrar para a Academia Militar – de mais de quatro décadas sempre ouvi a anedota do tipo que, na marcha, vai com o passo trocado e considera estar correcto e todos os restantes estarem errados! São os teimosos que nem desconfiam da sua teimosia, os obtusos que não aceitam as razões dos outros, os enviesados para quem o mundo está torto. Ora, Passos Coelho é em tudo semelhante ao militar (com as devidas salvaguardas) incapaz de aceitar que os outros têm razão e ele está errado. Mas pior do que ele ter esse sentimento é o facto de ter conseguido gerar uma pequena legião de seguidores que repetem até à náusea o discurso dele, que é o discurso do “fantasma” chamado Vítor Gaspar. E não me estranha esta defesa da política “gasparina” centrada na pessoa do Primeiro-Ministro, porque vivi três décadas de salazarismo e percebi como, resguardando-se Salazar dos contactos públicos, tinha, nos seus apaniguados, quem nos encharcasse o espírito com as virtudes da política do nosso fascismo!

O manifesto, que foi assinado por setenta e quatro individualidades portuguesas, não sendo nenhuma delas um simples “homem da rua”, mas especialistas conceituados, foi subscrito por outras setenta e quatro autoridades internacionais, que, igualmente, condenam a política de austeridade. E austeridade em nome de quê? De um défice orçamental e de uma dívida pública que parecem incontroláveis. E porquê esse descontrolo? Porque, por razões históricas, o grande empregador em Portugal sempre foi o Estado e alterar esta tendência passa por saber e conseguir captar capitais geradores de empregos mais aliciantes do que o de funcionário público. Mas a captação de capitais não pode ser orientada para empreendimentos já existentes; tem de trazer novas valias que simultaneamente satisfaçam a dois critérios: dar emprego a trabalhadores de baixas qualificações técnicas e educativas e oferecer trabalho a indivíduos com formação universitária, pois, na verdade, são estes dois extremos da faixa social portuguesa que procuram trabalho no Estado. Um desenvolvimento desta natureza deve ter como objectivo a satisfação do mercado interno e, especialmente, a exportação.

Repare-se que, quase toda, a estrutura da nossa economia ainda assenta nos princípios definidos pelo Estado Novo, com a amputação dos sectores dependentes do fornecimento de matérias-primas vindas das colónias. O grande erro na adesão à CEE passou pela incapacidade de formular uma estratégia económica para um Portugal a virar as costas a África e ao mar e a centrar-se no mercado Europeu. E, para definir este caminho novo, o Estado teria de ter sido muito mais interventor nos ditames da política económica. Ora, o grande slogan sobre o qual se fez a política económica de Cavaco Silva, Primeiro-Ministro, foi «Menos Estado, melhor Estado»! Ou seja, fez-se o oposto do que se devia fazer. E o mais grave é que a austeridade imposta pelo actual Governo vai no sentido de reforçar esta orientação confusa, inapropriada para a resolução dos nossos problemas estruturais e contra-natura nacional. Pior, este Governo não percebe ou não sabe, que o mercado não se interessa com a macroeconomia, pois tem sempre em mira a sobrevivência da microeconomia na perspectiva do máximo lucro para a empresa.

A necessidade máxima para o país é a de um Governo forte capaz de impor aos parceiros da União a realidade nacional e as verdadeiras necessidades de um povo e de um capital que, antes de se servir a si mesmo, sirva os objectivos de Portugal – objectivos que não estão ainda definidos! Quarenta anos se passaram e só se perdeu tempo, porque a herança do fascismo foi deitar gente na política cuja visão da democracia era limitada, e, da História e da Economia, era ou a que recebeu na vigência do Estado Novo ou as inapropriadas receitas fabricadas nas Escolas do estrangeiro que não se coadunam com nossa realidade.

O manifesto é, afinal, o primeiro passo para que se possam dar, com folga e alguma liberdade de respiração, os passos seguintes. Não perceber isto é, na minha opinião, desadequar um país e um povo, reduzindo-os a simples marionetas da vontade de um “mercado” sedento de sangue e carne frescos.

Que Deus tenha compaixão de nós todos!

Luís Alves de Fraga

 

 

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