Edição online quinzenal
 
Quinta-feira 18 de Abril de 2024  
Notícias e Opinião do Concelho de Almeirim de Portugal e do Mundo
 

A CULPA VAI MORRER SOLTEIRA

23-06-2017 - Francisco Pereira

Começo por endereçar um sentido voto de condolências a todos os que foram tocados pela tragédia de Pedrógão.

À data em que escreve, muito são ainda incertezas, sobre as causas da tragédia, questiona-se ainda a origem do incêndio, que continuo a lavrar, no entanto revisitando escritos antigos, meus, sobre o tema, fácil é obter desde já algumas certezas. Há cerca de uma década que vou escrevendo pequenos artigos sobre esta questão da floresta, não sou nenhum especialista, nem sequer tenho formação na área, sou apenas um curioso preocupado, um leigo atento que vai coleccionando memórias sobre os disparates contínuos que infelizmente nos trouxeram esta tragédia.

Revisitei então alguns desses artigos antigos, só para verificar que já tinha previsto esta tragédia, não especificamente esta, neste local, mas algo semelhante em termos de consequências nefastas. Este tipo de tragédia era aliás de fácil previsão, pois se um simples labrego como eu, a previu, mais facilmente os inteligentíssimos senhores do poder, das protecções civis e de todos esses superlativos organismos que alegadamente cuidam da floresta estariam cientes da possibilidade de um descalabro destes.

Ouvi o secretário do Estado declarar que “… neste caso a culpa não pode morrer solteira…”, temo bem que sejam palavras ao vento. Culpados, bem isso, somos todos. Aquelas pessoas morreram por incúria e laxismo de um Estado inepto, de uma sociedade de mendigos intelectuais, de farsantes de colete cor de laranja, de gente arrogante e pateta. Aquelas pobres pessoas foram os cordeiros sacrificais imolados no altar de uma sociedade patética, medíocre e miserável.

As lágrimas de crocodilo caíram em catadupa, mesmo daqueles que quando ministros assinaram leis medíocres que permitem plantar eucaliptos até em vasos numa varando de um terceiro ou quarto andar, muita da culpa desta tragédia recaí sobre os ombros dessa gente politica, sem vergonha, e sim, isto é que é uma verdadeira pouca vergonha.

A legislação existe, extensa que é, mas como noutros casos, ninguém a cumpre, ninguém a faz cumprir e ninguém a fiscaliza, governos e municípios fecham os olhos somos o Estado do “laissez faire”, quando a coisa dá para o torto, lá aparecem eles de colete cor de laranja e azuis, muito untuosos e com frases muito bonitas, que não cobrem porém a incompetência generalizada, são os mesmos que há décadas assassinaram o interior do país, morte que continua todos os dias.

O ordenamento territorial, coisa que o rei dom Fernando levou a cabo há seiscentos anos, ainda sem computadores, nem auto-estradas, nem protecções civis nem nada dessas patranhas, fica como o único trabalho sério e duradouro de cadastrar e ordenar o território, não precisam de inventar nada basta adaptar aos tempos modernos, não é preciso demonizar o eucalipto, é preciso apenas ordenar o seu plantio, actualmente esta espécie ocupa mais de oitocentos mil hectares, é preciso domar a sede e a ganância das empresas de celulose e dos particulares, é preciso voltar a ter serviços florestais condignos, é preciso fazer uma coisa muito simples que em Portugal parece ser complicada, cumprir a Lei e fiscalizar o seu cumprimento, com isto tudo acabam os incêndios, claro que não, mas estou seguro que as suas consequências serão muito menores, porque, está provado, que isto como está não funciona.

Infelizmente, em Portugal, preferimos o faz de conta, alguém entende porque é que a Força Aérea fica de fora do combate aos incêndios? Alguém entende, porque se desperdiçam milhões em loucuras e tostões em prevenção. Alguém entende como é que governo atrás de governo, os ministros da Agricultura, assassinem as florestas e o interior do país, com decretos medíocres, como o que foi assinado pela anterior ministra da agricultura, legislação que o actual governo deveria ter rasgado, mas nada fez, conivente que foi com a desmedida cretinice.

Alguém entende que este país seja cada vez mais um eucaliptal contínuo? Esta era uma tragédia anunciada, cedo ou tarde, a conjugação de factores certos, faria das suas, como fez em Pedrógão, o que falhou? Falhou quase tudo, falharam os telefones, a limpeza das matas, o correcto ordenamento, os coletes cor de laranja e os barretes patéticos, dá a ideia de que falhou quase tudo, excepto mais uma vez a coragem e abnegação de um povo, sim esse povo simples, quase analfabeto, culturalmente embrutecido, mas de coração generoso, essa é a única constante aqui, nós os do povinho, só podemos, ao que parece contar connosco.

Francisco Pereira

 

 

 Voltar

Subscreva a nossa News Letter
CONTACTOS
COLABORADORES
 
Eduardo Milheiro
Coordenador
Marta Milheiro
   
© O Notícias de Almeirim : All rights reserved - Site optimizado para 1024x768 e Internet Explorer 5.0 ou superior e Google Chrome