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NA ORIGEM DO REGIME SALAZARISTA
A «REVOLUÇÃO» MILITAR DO 28 DE MAIO DE 1926

05-05-2017 - Pedro Pereira

No dia 28 de Maio de 1926 (faz este mês 91 anos) deu-se um levantamento militar em Braga, chefiado pelo general Gomes da Costa, que alastrando nos dias seguintes ao resto do país, instaurou uma ditadura militar que irá originar poucos anos depois, um novo regime auto denominado de «Estado Novo», em oposição ao que os golpistas chamavam de «República Velha».

Os mentores do Estado Novo promoveram a criação de um partido a que chamaram de União Nacional, à frente do qual pontificava o lente coimbrão, António de Oliveira Salazar. No entanto, segundo palavras do futuro ditador, não se tratava de um partido político nem devia ser assumido como tal, antes era, uma «associação de homens de boa vontade».
O golpe militar de 28 de Maio foi um movimento eivado de equívocos e é nesse sentido que se explica que a ele tenha aderido muita gente de boa fé, que lenta e gradualmente nos tempos que se seguiram irá afastar-se ou ser afastada do assalto ao poder.

A revolta militar contou com o apoio das classes dominantes, as chamadas «forças vivas» da nação, mas também das classes sociais, de profissões intermédias e até da classe operária; operários industriais e assalariados agrícolas.

O jornal «A Batalha», órgão oficial da Confederação Geral do Trabalho, no dia 29, logo a seguir ao golpe militar, refere num comunicado: «(…) O operariado, pela natureza da sua organização, é alheio e não intervém nos acontecimentos públicos. Não tem ambições de Poder; tem como aspiração máxima a destruição de todo e qualquer poder político (…)», acrescentando sobre o levantamento militar: «8…) Do movimento revolucionário sabe-se apenas de positivo que hostiliza o partido democrático, cuja alma e cujo cérebro – ambos bem escassos – são o senhor António Maria da Silva (…) Faz hoje precisamente dois anos que nos Olivais a Polícia caçou a tiro alguns operários (…)».

No estado caótico em que o país de encontrava, quer económico, quer social e em outras áreas, era previsível um golpe militar no estilo do ocorrido. Aliás, na sequência de uma série de outros que tinham vindo a suceder-se sem que tivessem tido, no entanto, a amplitude deste último, para o sucesso do qual contribuiu decisivamente o apoio da referida classe operária e do movimento sindical, vítimas do regime republicano cuja expressão máxima de revolta contra ele se consubstanciou em Afonso Costa, cognominado de «racha sindicalistas», dada a repressão feroz exercida por este político quando ocupou o cargo de primeiro-ministro, o que aconteceu por três vezes durante a 1ª República.

Enfim, a maioria da população portuguesa estava de acordo em fazer intervir o exército, onde o nível de vida dos seus oficiais havia atingido um estado social degradante e até humilhante.

Aludindo ao brilho dos galões, o povo havia-os rotulado de «miséria dourada». Os equipamentos e o armamento das forças militares estavam obsoletos. Por outro lado, durante anos o exército havia sido preterido a favor da Guarda Nacional Republicana, força pretoriana criada em 1911 pelo governo republicano para defender os governantes do regime.

Pairava no ar o fantasma da região da Flandres, do Vale da ribeira de La Lys (9 de Abril de 1918) onde os exércitos alemães infligiram uma pesada derrota aos militares portugueses como não sucedia desde a batalha de Alcácer Quibir, onde o rei D. Sebastião desapareceu à espadeirada contra os muçulmanos numa manhã de nevoeiro empunhando a espada (mais corretamente, o montante) de D. Afonso Henriques.

Saldaram-se por largos milhares os portugueses mortos, feridos, desaparecidos e feitos prisioneiros no decorrer da 1ª Grande Guerra. Enfim, o exército desmoralizado foi naturalmente conduzido a assumir a direção política do país contra o republicanismo que o havia deixado cair tão fundo. A República dissolvia-se ingloriamente deste modo, por falta de apoio popular.

Até 31 desse mês (Maio de 1926), altura em que o presidente da República, Dr. Bernardino Machado, demite-se transmitindo os seus poderes ao comandante da Marinha, Mendes Cabeçadas, que será por breve tempo o 9º Presidente da República, a revolta ainda tinha algo de constitucional face a essa mesma transmissão de poderes…

Enquanto o General Gomes da Costa avança sobre Lisboa, liderando o movimento em substituição do General Alves Roçadas, morto recentemente, o General Óscar Fragoso Carmona, temeroso em princípio, ao vislumbrar a vitória quase certa depois do avanço das tropas a partir de Braga sem oposição de relevo, enche-se de coragem e ordena o avanço das suas tropas alentejanas a partir de Évora sobre a capital, apoiando assim o movimento revolucionário.

Em Novembro desse ano Carmona assume a chefia do Estado.
De 1926 a 1933/34, há como que um estado de guerra civil não declarada entre vários sectores republicanos visceralmente desavindos e a ditadura militar. A situação não é muito definida. Trata-se do período de transição da ditadura militar para o novo regime em incubação, o Estado Novo. Período muito conturbado, com uma base de apoio muito complexa como atrás referido. No entanto só se poderá falar de consolidação do novel regime a partir de 1934, ano do primeiro Congresso da União Nacional (muito embora esta organização política tivesse sido criada em julho de 1930) de remodelação do governo e das primeiras eleições legislativas, delas tendo saído a primeira Assembleia Nacional, assolapada em S. Bento.

Em 5 de Julho de 1932, Salazar foi formalmente nomeado chefe do governo (cargo que ocupou até 27 de Setembro de 1968).

Ainda nesse ano apresenta uma proposta de Constituição que entrará em vigor em 11 de Abril de 1933, a qual irá vigorar com pequenas alterações até 1976.

Para que o leitor tenha uma pequena ideia do sentir e do pulsar que reinava no seio da sociedade portuguesa relativamente aos anos de governação rotativista republicana, passamos a seguir um exemplo:

No Barreiro, o movimento do 28 de Maio de 1926 teve características de adesão idênticas ao que se passou um pouco por todo o país.
Nessa vila, os grupos civis conspiratórios apaniguados dos golpistas eram constituídos por elementos quase todos ligados ao Partido Radical, enquadrados por chefes oriundos de Lisboa. O apoio logístico, fundamental para o avanço das tropas do Sul sobre Lisboa foi dado pelos ferroviários do Sul e Sueste (transportados em comboios), vítimas do regime republicano que os havia sempre tratado com sobranceria e até formas de violência diversas, de resto, retribuída pelos ferroviários em permanente luta por melhores e mais dignas condições de vida, manifestas nas lutas empreendidas ao longo da existência do regime. Algumas destas batalhas foram bastante longas como a registada entre Setembro e Dezembro de 1920, que durou setenta dias e à qual o quinzenário barreirense «Acção» de 20 de Dezembro desse ano se refere na 2ª página sob o título “Ferroviários”, como tendo «(…) contado prejuízos incalculáveis (…), prejuízos esses, cremos, a todos os níveis».

Pela mesma data, a propósito desta greve, o semanário lisboeta «A Luz», refere na sua 4ª página, «(…) teve enfim termo. Já não era sem tempo (…) a greve dos ferroviários não teria lugar se a administração da Companhia dos Caminhos-de-ferro Portugueses não fosse uma soberba amostra do que, em regra, é toda a administração em que entra o portuguesinho (…) cabe pois, à direcção da Companhia a responsabilidade de todos os prejuízos que esta lamentável greve ocasionou (…)».

A realidade é que a direção da CP era o espelho da Administração do Estado, da coisa pública.

Porém, os princípios da generosidade, a luta pelos ideais de Liberdade e por melhores condições de vida que levaram os ferroviários a apoiar o golpe do 28 de Maio, serão os mesmos que os levarão a participar poucos meses passados na primeira revolta contra a ditadura militar, mais concretamente em Fevereiro de 1927, com a paralisação de comboios e a sabotagem de máquinas.
Tal como centenas de milhar de cidadãos, grupos sociais, agrupamentos políticos, classe operária e outros, também os ferroviários cedo constataram o logro em que haviam caído. Se a República os havia tinha tratado mal, a ditadura militar não os tratava melhor. Porém, a força das armas impunha-se. Os traidores, os delatores (a bufaria) pululavam entre os cidadãos, até no seio de famílias, contribuído cada um dos novos próceres do regime em ascensão larvar e à compita para a construção e consolidação de uma ditadura de cariz rural, feroz, à imagem do ditador, que perduraria até ao 25 de Abril de 1974 e haveria de fazer escola nalguns países europeus, até ao final da 2ª Grande Guerra Mundial.

Pedro Pereira

 

 

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