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AS FA COMO ELEMENTO ESTRUTURANTE DO ESTADO DE DIREITO (6)

13-03-2015 - Neto Simões (*)

“O certo é que a teoria dos conflitos que se agravam, se renovam, e desaparecem, não anuncia tranquilidade, e uma política de dispensa de Forças Armadas”. (Professor Doutor Adriano Moreira).

Nos últimos anos, realizaram-se importantes alterações, que permitiram ao País ter até 2009 (reforma em implementação) umas Forças Armadas (FA) diferentes e com melhores capacidades para integrarem forças multinacionais – mesmo com algumas limitações, incluindo equipamento critico emprestado por outros países -, cujo desempenho tem sido reconhecido ao nível internacional.

As FA têm contribuído de forma indelével para a afirmação e credibilidade externa de Portugal. Isto devia ser explicitado aos cidadãos – pela classe politica sem ambiguidades - para que se combata o “discurso da inutilidade”. Saber fazer pedagogia sem demagogia.

As FA são a Instituição que mais se reformou passando da guerra de África com 240 mil homens (45% do orçamento) para um modelo de segurança cooperativa e operações de apoio à paz e humanitárias com cerca de 30 mil efectivos e um custo de 1,1 % do PIB.

A crise não devia condicionar as funções de soberania e o exercício da autoridade do Estado em função de critérios contabilísticos impostos do exterior, que comprometem a Segurança Nacional. Inaceitável ingerência no reduto intocável da soberania. As obrigações que o País assumiu perante os credores estão de acordo com os compromissos já assumidos perante outras entidades internacionais?

O Governo ao reduzir drasticamente os recursos das Forças Armada (FA) – através de um MDN que não entende a sua importância como Instituição estruturante do Estado e da identidade nacional – retira-lhe capacidade operacional e prontidão.

A configuração do Sistema de Forças (SF) é determinada pela exigência do quadro estratégico internacional prevalecente e previsível. E Portugal faz parte de uma região com instabilidade latente em que a UE terá que assumir maior esforço na defesa, face à alteração estratégica dos EUA e da NATO.

A revisão do Conceito Estratégico de Defesa Nacional (CEDN) - documento estruturante da Política de Defesa Nacional (PDN)- devia permitir clarificar, sem sofismas, o que se pretende das FA. Contudo, O ciclo de planeamento estratégico foi “subvertido”com o corte de efectivos - antes da aprovação do CEDN e Conceito Estratégico Militar – e não reflectem os riscos e as melhores opções. Este método criativo só serviu para iludir e acelerar o processo de decisão. Mas a realidade é ficção.

O MDN tem confundindo o contribuinte sobre os efectivos e a operacionalidade das FA, concluindo a reforma com um quadro legislativo incoerente que vai provocar disfunções na Defesa Nacional. Além do mais, exibe preocupantes confusões ao nível das ameaças, alianças, de meios e fins na prossecução do interesse nacional.

As FA deviam ainda assegurar o apoio à segurança interna na prevenção ao combate às novas ameaças - terrorismo e crime organizado transnacional -, através do enquadramento legislativo que assegure a subsidiariedade e a complementaridade da sua intervenção. A adopção de uma Lei de Segurança Nacional (LSN) - através de um Sistema Integrado de Segurança Nacional - possibilitaria ainda evitar disposições conflituantes e melhorar a indispensável articulação entre a LDN e Lei de Segurança Interna, assegurando a eficiência da PDN e contornando a revisão constitucional. Em Timor-Leste resultou com eficácia.

E conclui-se a reforma – com direito a coreografia falaciosa e propagandística televisiva - sem qualquer programa de modernização no quadro de um processo de reequipamento, com redução de sistemas de armas, por alienação, sem recursos para garantir, quer uma manutenção adequada dos equipamentos ainda existentes, quer o treino que é devido às tropas, sejam os exercícios em terra, no mar. O MDN não conseguiu provar que “com menos é possível fazer mais”e pode vir a provar – com responsabilização política, que na actividade de riso da FA, na maioria das vezes, o erro se paga com a vida.

Todavia, as FA têm que estar organizadas e preparadas, em tempo, para cumprir as missões atribuídas pelo poder político. Para isso, são necessárias capacidades militares -que assegurem o SF com coerência operacional -, com meios e efectivos necessários, de acordo com o nível de ambição estabelecido, sem demagogia e assumindo os riscos de ameaças que não respeitam fronteiras e cuja soberania, por vezes, tem de se defender nas fronteiras de Segurança e fronteiras dos Interesses.

A tão proclamada reforma “Defesa 2020” foi inspirada no modelo Dinamarquês e ficou evidente o irrealismo do padrão comparativo: além da metade da população, as FA estão assentes num sistema misto, os gastos com as FA são superiores, em cerca de 50%, ao Orçamento em Portugal. Inaplicável.

É imperativo nacional controlar e defender o nosso espaço geográfico. A posição geográfica do nosso país e dimensão essencialmente marítima - espaços marítimos com 20 vezes o território terrestre – e configuração arquipelágica. É incomparável. Outrossim, são diferentes a inserção geopolítica e geoestratégica nacional com uma diáspora única, para além interesses nacionais estratégicos específicos. Estes factores deviam ter sido ponderados no redimensionamento dos efectivos, estruturação dos ramos e meios necessários ao SF.

É também necessário explicar melhor aos portugueses a opção do modelo profissional (1994) e seus custos. E urge reavaliar o modelo de serviço militar, que assegure o nível de efectivos com menores custos, que alerte para a componente cívica e reforce a coesão nacional.

A actuação das FA depende da capacidade de defesa territorial (missão principal), fiscalização dos espaços de soberania e jurisdição nacional, protecção e evacuação de cidadãos nacionais e segurança cooperativa, potenciando a capacidade de operações especiais conjuntas. As FA deviam ainda ter uma Unidade Nacional de Apoio Logístico (apoio do Exército a missões de interesse público) e capacidade de projecção através do tão falado Navio Polivalente Logístico para emprego dos três ramos das FA.

As características do território nacional, responsabilidades do Estado português e a conjuntura internacional aconselham a necessidade de um navio vocacionado para proporcionar a mobilidade estratégica por via marítima de Forças Expedicionárias Anfíbias de intervenção rápida, com capacidade de projecção, dissuasão e ainda para apoio e assistência a populações civis. Além da “maior probabilidade de emprego” proporcionará maior visibilidade a Portugal. Desde da década de 90 que está previsto pelas sucessivas Leis de Programação Militar a construção e desenvolvimento de um Navio Anfíbio.

Ficou reduzida a capacidade de intervenção aumentando os riscos em caso de necessidade de resposta a ameaças complexas militares - elevada probabilidade pela alteração da ordem internacional - como a crise da Ucrânia, o combate ao Estado Islâmico, instabilidade no mediterrâneo, Médio Oriente e norte de África e os riscos de natureza não militar como o apoio a catástrofes. Ou seja, o contrário do que foi anunciado seguindo o discurso político criativo com mistificação da realidade iludindo a opinião pública.

O MDN devia explicar melhor porque “é possível hoje Portugal ter outra vez condições para poder reequipar as FA”. Basta de demagogia! Todos sabemos que a mudança não é só um problema de dinheiro, depois dos dislates orçamentais com a banca, subvenções milionárias e aumento na despesa.

A pressão das ameaças e os compromissos ao nível internacional passou a ser mais exigente. Pesam mais do que os avisados conselhos que precederam os estudos da revisão do CEDN. As declarações problemáticas do MDN com arrogância política, de quem tudo sabe, afrontam e prejudicam qualquer debate estratégico que falhou. Mas, a defesa dos interesses da Defesa Nacional, tem de ser feita por quem tem a razão do poder e não por aqueles que com soberba querem impor o poder sem razão.

Por outro lado, os militares têm estado na linha da frente dos sacrifícios mais pesados impostos aos portugueses enquanto outros são escandalosamente excepcionados num regime em que o neo-confiscalismo e nepotismo são tendências de uma perigosa governação. Não serão possíveis mais exigências sem justiça social.

Porém, os “cortes cegos” efectuados – afectam a gestão operacional, as condições de segurança, a saúde militar – caos e discriminação com dupla tributação - degradou as condições de vida e, consequentemente, a prontidão das FA. Inusitado comportamento, que conduz ao incremento generalizado da desmotivação e afecta, seriamente, a Condição Militar essência da organização.

A reforma da saúde militar devia constituir uma oportunidade para garantir melhores cuidados de saúde e uma melhor optimização de meios disponíveis. Porém, a realidade do Hospital das FA (HFAR) é a imagem da reforma anacrónica. A criação do HFAR, visava garantir a prestação de “cuidados de saúde de excelência”, permitindo também assegurar a eficiência dos recursos. Parece que assim não é.

O HFAR tem como finalidade servir a instituição militar, “não sendo compreensível que outros interesses” se sobreponham à “operacionalidade e qualidade do serviço prestado”. Juntar três hospitais num só para reduzir custos não é reformar! O HFAR não tem as valências nem infra-estruturas necessárias para as necessidades. A capacidade de resposta na Urgência é inferior à que existia no Hospital Militar Principal, no da Força Aérea e no da Marinha.

A descriminação é negativa com cortes na assistência, na saúde e no apoio à Família Militar, em claro desrespeito pela Condição Militar e pela Lei 11/89, de 1 de Junho. Não respeitar a Condição Militar é por em causa uma das funções essenciais do Estado criando insegurança e incerteza na Instituição e nos cidadãos. E o novo Estatuto com o secretismo da revisão caminha para a governamentalização das FA. Inadmissível!

Aos militares é exigida disponibilidade permanente, incluindo sujeição dos riscos inerentes às missões com renúncia aos interesses pessoais e mobilização automática que vai até ao sacrifício da própria vida – assumido no juramento perante a Bandeira Nacional. Não se pede nada disto a um funcionário público a quem o MDN quer equiparar os militares. Onde está o senso comum?

A reforma dos “cortes cegos”, além do imposto pela troika, atinge a degradação e dignidade das nossas FA. Ou seja, atinge a Condição Militar, contrariando o Presidente da República “…meios e equipamentos de qualidade e pessoal motivado evitando a degradação das capacidades.” Não basta afirmar a Paz esquecendo que a resolução de conflitos pode obrigar à utilização da força militar. As catástrofes, conflitos e crises não avisam. A Defesa Nacional não pode ser um milagre!

As FA constituem-se como um dos seus indispensáveis e fundamentais esteios; são o braço armado da Nação e garantia da sua afirmação. São parte de um todo, dando expressão plena ao sentido nacional, e também instrumento da vontade colectiva do Povo português.

Estamos a falar da desconstrução do Estado e da subversão da Nação (tendo presente que o Estado é a nação politicamente organizada). Via única que vai sendo traçada para fragilizar e desestruturar pilares essenciais, deixando-o sem os meios e as capacidades que permitam cumprir as nobres funções que a Nação lhe exige. Tem sido indubitável a incompetência, sobranceria, despudor e, até, ilegalidade com que sucessivos governos têm vindo a tratar as FA! E não são os militares que estão no sítio errado.

Os compromissos vão passar a ser muito mais exigentes numa UE fragmentada em que a solidariedade deixou de estar em exercício também ao nível da segurança pela inacção da liderança esquizofrénica.

A “lógica de reinvestimento” resultará das orientações da NATO (2 a 3 % do PIB) e outras realidades que exigem maior nível de participação do que 1% do Orçamento da Defesa impostos por quem “ofendeu a dignidade dos povos” (Junker). Inaceitável intromissão e submissão que o PM considera normal.

A imprevisibilidade e tipo de ameaças transnacionais, as missões e os requisitos de defesa exigem reponderar a estratégia e proceder a alterações que deviam levar os decisores a concluir ter de orientar mais e melhores meios para as FA, com um SF mais eficaz e exigente. Exige, pois, saber explicar ao País.

As FA são um importante instrumento do Estado de salvaguarda da coesão e soberania nacionais, constituindo, a afirmação da credibilidade de Portugal. Mas ao nível interno não podem ser afectadas e desprezadas. Espera-se, por isso, que um outro CEDN – integrado numa Estratégia Nacional -, possa garantir a articulação com os meios e os recursos necessários existindo a assumpção plena dos custos de soberania e o reforço da coesão e do prestígio das FA como já deixou bem expresso o Presidente da República (Professor Cavaco Silva).

(*) Neto Simões, Capitão-de-Fragata SEF (Reserva )

 

 

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