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Notícias e Opinião do Concelho de Almeirim de Portugal e do Mundo
 

A PRIVATIZAÇÃO DA ÁGUA NO MUNDO

20-02-2015 - Joaquim Miguel dos Santos Pisco

O assalto do poder económico na privatização dos serviços de água tem sido alucinante e um bom exemplo do caracter defeituoso dos políticos e politiquinhos de Portugal e do mundo.

Se em 1996 a participação privada no abastecimento público era apenas residual e presente apenas em França, na Inglaterra e um pouco em Espanha, já em 2001 o Banco Mundial apontava, para a data, a gestão/concessão a privados de 5% do abastecimento público do mundo e, mais grave, em crescimento acelerado e virtualmente imparável.

Os operadores privado puros concentram-se praticamente em sete grupos económicos, encabeçados por duas multinacionais de origem francesa – a Suez/Lyonaise des Eaux e a ex-Vivendi (ex-Generale des Eaux, CGE), sendo que esta última já está instalada em Portugal através de várias concessões de abastecimento de água e outros serviços, como, por exemplo a Transtejo.

Ao contrário do comumente pensado, essas mega-empresas actuam muito mais em corporação ou oligopólio que em concorrência, integrando-se em grupos de pressão – os famosos lobbies – capazes de tudo comprar e fazer decidir junto dos órgãos de poder supranacionais, sobretudo os financeiros e os deles dependentes como os politicos — Banco Mundial, FMI, GATS, ALCA, UE, MERCOSUL, etc.

Na última década, sobretudo, o seu poder tem vindo a crescer de forma exponencial e dominam, de facto, a política mundial da água, sempre na perspectiva do lucro máximo e sem darem grande importância ao facto de no abastecimento de água estarem em causa pessoas que dela dependem para a sobrevivência com um mínimo de qualidade de vida.

A titulo de exemplo estas mega-empresas fazem parte do Conselho Mundial da Água, que organiza o Fórum Mundial da Água e junto à União Europeia, a Vivendi e a Suez fazem parte, por exemplo, do "Fórum Europeu dos Serviços" (ESF), acreditado como ONG e consultado nos processos de decisão, incluindo muitos que não são submetidos ao Parlamento Europeu.

A privatização dos serviços de água significa uma enorme concessão de poder político e a jusante, do poder de autodeterminação dos cidadãos, em favor do poder económico. No entanto, este processo de rapina tem tido a conivência da maior parte dos Governos dos países ricos e tem sido imposto aos países com dívida externa pelo Banco Mundial e FMI assim como pela União Europeia, vide as condições assinadas pelos nossos grandes líderes para o Programa de Assistência.

Sendo certo que a privatização pura e dura é ainda minoritária e encontra oposição e farta resistência na maior parte dos países da União Europeia, EUA e no Canadá, também é verdade que a pressão continua, sobretudo através dos acordos internacionais de comércio e a Directiva Quadro da Água da UE que está a ser o vírus injectado pelos lobbies da mercantilização da água. Muitos Governos que não tiveram ainda força para implementar a privatização nos seus países, devido à oposição dos cidadãos, têm sido coniventes e agentes activos desta legislação.

Em Portugal, desde logo o anúncio por parte do Governo PSD/CDS, aquando da sua tomada de posse, da intenção “irrevogável” de privatizar as Águas de Portugal, tornou evidente a orientação política de privatização de todo o sector das águas, o que pela iminência, gravidade e sobretudo pelos múltiplos e “cuidadosos” elóquios debitados, tanto pelos trapaceiros do Governo como pelos inaptos da Oposição, fez despoletar uma reacção por parte do Povo Português nada habitual e que suspendeu todo o processo. Mas tal intenção anunciada não é uma intenção nova – é o culminar de um processo de duas décadas, conduzido pelos sucessivos Governos e maiorias parlamentares, umas vezes escudadas em legislação comunitária e outras, a maioria, por puros interesses pessoais.

Ao contrário de outros países, como a Holanda e a Irlanda, que garantem o carácter exclusivamente público da água e dos serviços de água, em Portugal foram sucessivamente removidas as defesas legais do direito público aos serviços de água, através de um longo processo legislativo que decorreu basicamente de 1982 a 1994, passando a ser permitido que o Estado sacudisse a responsabilidade de prestar os serviços de água aos cidadãos, concessionando ("arrendando") a longo prazo as infra-estruturas e os serviços a empresas privadas para exploração comercial.

No entanto, convém não esquecer que os serviços de água são competência autárquica e que só algumas autarquias concessionaram “voluntariamente” os serviços, em resultado de inúmeras pressões, por parte dos sucessivos Governos, para impor às Câmaras renitentes a transferência, para o Estado Central, das competências e infra-estruturas – ou, pelo menos, da parte mais importante a longo prazo, a ligação com o ciclo hidrológico.

E eis que nos deparamos com os chamados sistemas multimunicipais, que mais não são do que um modelo administrativo de gestão comum a vários municípios das componentes com ligação directa ao rio, nomeadamente a captação, tratamento e adução, no abastecimento de água, ou transporte, tratamento e rejeição, nos sistemas de águas residuais, ficando as Câmaras apenas com competências sobre as redes.

Aqui chegados e tendo em conta o que nos calha no nosso concelho, tive a oportunidade de comparar o cobrado/facturado pela empresa Águas do Ribatejo e o cobrado/facturado por diversas Câmaras onde a gestão é própria e que mantêm as competências e o serviço público, servindo aqui o exemplo do Município de Aljezur, a saber:

ITENS

Almeirim – Águas do Ribatejo

Câmara Municipal de Aljezur

Taxa Disponibilidade

5,60 €uros

4,01 €uros

Saneamento

6,14 €uros

1,59 €uros

Resíduos Sólidos

9,08 €uros

3,29 €uros

1.º Escalão Consumo

0,38 €uros

0,28 €uros

2.º Escalão Consumo

0,83 €uros

0,34 €uros

Esclarecedor quanto ao modelo mais vantajoso economicamente para o comum cidadão e nem apresento os valores cobrados aos grandes consumidores, geralmente empresas, por serem tão revoltantemente injustos para os domiciliados no concelho de Almeirim e nos concelhos intervencionados pela Águas do Ribatejo, que merecem um artigo próprio.

Logicamente que os custos associados à actividade de uma empresa como a Águas do Ribatejo são imputados ao consumidor, no entanto a disparidade de números é tão acentuada que me permite, na minha modesta opinião, continuar a manter que as competências e serviço público concernentes á água deveriam ser exclusivo de gestão própria dos Municípios, evitando-se despesas com faustosos vencimentos com Directores, Assessores e Avenças muito pouco transparentes com os do costume – e que, para cúmulo, não só não são públicas como não são sujeitas a qualquer tipo de controlo ou sequer a concurso público para a contratação.

Joaquim Miguel dos Santos Pisco

Advogado

 

 

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