EM PORTUGAL HÁ 50 ANOS
22-08-2025 - Pedro Pereira
Porque os tempos que vivemos hoje em Portugal, do extremar de posições políticas entre portugueses, passamos a elencar um breve resumo sobre o contexto vivido há cerca de cinquenta anos no país.
Neste período, há 50 anos, Portugal encontrava-se a “ferro e fogo”.
Pouco mais de um ano antes, no dia 25 de Abril de 1974, tinha ocorrido o golpe de estado militar, que em breve, por pressão do povo, descambou numa revolução nacional, que se propagou não só ao país, mas, naturalmente, se repercutiu nos territórios ultramarinos, com graves consequências para os povos que habitavam em Angola, Moçambique, Guiné, e demais territórios portugueses de além-mar, sendo que, nos dois primeiros, o golpe de estado em Portugal redundou numa tragédia de que ainda hoje se sentem os seus efeitos. Quer para os nascidos em Portugal, quer para os seus descendentes e, também, para os povos autóctones.
Com as independênciasem 1975, e as guerras civis entre os movimentos de libertação em Angola (MPLA, UNITA, FNLA) e em Moçambique (FRELIMO e a RENAMO), acompanhados do assalto a pessoas e bens portugueses (casas, terras, fábricas, etc.), deu-se início à maior fuga maciça de pessoas (brancos, negros, mestiços, etc.) de territórios, de há registo na História da humanidade. Contaram-se por centenas de milhar aqueles que fugiram por terra, mar e, sobretudo pelo ar, na maior ponte aérea para Portugal de que há registo até hoje neste país ou qualquer outro, a que os que viviam em Portugal apelidaram pejorativamente de “retornados”, quando a maioria, embora portugueses, tinham nascido nesses territórios ultramarinos, logo, não retornavam, antes, eram refugiados.
Entretanto, a partir de Abril de 1974, havia tido início o PREC (Processo Revolucionário em Curso), que teve o seu final com o desencadear da crise política/militar do 25 de Novembro de 1975. Pese embora tenha sido uma data enquadrada num cenário de pré-guerra civil - passível de um golpe de estado frustrado - a actuação de Ramalho Eanes, então comandante da Região Militar de Lisboa (com a patente de tenente-coronel) e das forças militares que o apoiavam, culminou no controlo da situação sem que se tivessem registado vítimas mortais nesse dia, no território nacional. O seu papel foi fundamental na contenção da acção de grupos políticos de extrema-esquerda que pretendiam a tomada do poder e, na garantia da ordem constitucional. Não obstante, o período decorrido entre Abril de 1974 e Novembro de 1975, envolveu confrontos militares e actos de violência por parte de bandos civis, que deixaram um rasto de crimes de sangue, não resolvidos, entre grupos e grupelhos políticos de extrema-esquerda e outros da extrema direita radical.
Esses ocorridos incluem, sem que se tenham limitado tão só, a confrontos entre diferentes facções políticas como as ocupações ilegais de propriedades, entre elas, a chamada “reforma agrária” no Alentejo e Ribatejo, as nacionalizações de fábricas, estaleiros, siderurgia nacional, companhias de navegação, companhias de seguros, bancos, assim como a ocupação selvática de milhares de pequenas e grandes fábricas, tudo isto acompanhado na maior parte dos casos, por roubos, saques, assaltos e vandalismo, a que se somaram, em muitos casos, crimes de sangue.
A instabilidade política resultante da derrocada do regime de ditadura, e a consequente falta de autoridade consolidada, contribuíram fortemente para a impunidade de muitos crimes cometidos, dificultando a investigação, detenção e punição de muitos dos seus responsáveis.
De entre os crimes e actos violentos, destaquem-se também os episódios de violência física entre diferentes grupos políticos, como os perpetrados entre militantes de partidos de extrema-esquerda e os seus opositores, culminando em muitos casos, em mortos e feridos graves.
Por seu turno, como acima referido, as ocupações de propriedades agrícolas e urbanas, como herdades, palacetes, habitações e de fábricas, redundaram em graves danos para as propriedades, para os seus proprietários e para o desmantelamento de grande parte do tecido produtivo do país.
Associados a estes factos, a falta de segurança generalizada e a instabilidade política, conduziram a um aumento exponencial de assaltos, roubos e actos de vandalismo, sem que até hoje, na maior parte dos casos, estes não tenham sido investigados nem tão pouco resolvidos. É claro que a transição para a democracia foi um período muito complexo nos mais diversos aspectos, com diferentes órgãos de poder disputando autoridade. Isso dificultou a investigação e a punição de crimes, sendo que a instabilidade política e a polarização ideológica, dificultaram a investigação de crimes cometidos por diferentes grupos e partidos políticos.
Em suma: Muitos dos crimes patrimoniais, mas sobretudo de sangue, cometidos durante o PREC, permanecem impunes, deixando até aos dias de hoje, um sentimento de injustiça e de frustração em muitas das pessoas que viveram esse período, sendo que devem ser levados em conta os danos provocados à memória colectiva, uma vez que a falta de investigação e responsabilização pelos crimes cometidos durante o PREC contribui para a dificuldade em construir uma memória colectiva sobre esse período da história contemporânea portuguesa.
Nos dias seguintes ao 25 de Novembro de 1975, Ramalho Eanes é nomeado Chefe do Estado Maior do Exército. Sete meses após dos acontecimentos é candidato à presidência da República e conquista o lugar à primeira volta com 61,5% dos votos.
Tinha assim início, com a eleição do primeiro Presidente da República após a restauração da democracia, o período que desde então vivemos.
Pedro Pereira
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