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Em terra de cego…

15-04-2022 - Francisco Pereira

Há uns tempos, numa das suas edições, o jornal cá da terra, trazia um artigo com o título “Almeirim vai ter passadeiras sinalizadas para cegos” (1) na altura bendisse os Céus que iluminaram a mente de tão esclarecidas criaturas que deram à luz tão grossa e magnifica empresa para usufruto de todos nós insignificantes e néscios borra-botas cujos parcos merecimentos desmerecem tão nobres e portentosas mentes governantes, hossana Senhor, pois que guiados por tão perspicazes dirigentes, prestes atingiremos os píncaros da sublimação etérea.

Posteriormente estudando mais a fundo o tema, depressa cheguei à conclusão que a necessidade de passadeiras sinalizadas para cegos era uma velha aspiração da terra, dado existir nesta terra uma grande, ou antes, uma enorme comunidade de cegos, facto que desconhecia e para o qual fui alertado, por um amigo, que me fez ver, com o correcto olho clínico de observador experimentado, que esta localidade é uma verdadeira “terra de cegos”, logo ser absolutamente imperativo que existam passadeiras assinaladas que facilitem o atravessamento das ruas e estradas pelas existentes hordas de cegos e amblíopes que por aqui habitam.

No entanto e até ver, essas passadeiras sinalizadas, resumem a sua existência a duas ou três ruas ali no centro da localidade, mais umas quantas junto a uma superfície comercial, que foi quem efectivamente trouxe a ideia, a enorme comunidade de cegos que reside em Almeirim, vê portanto muito limitado o atravessamento em segurança das ruas. Quanto ao resto da “cidade e ou do Concelho, “os ceguetas” dessas zonas que se desenrasquem, olha comprem um cão, parece ser a política mais avisada, estou porém certo que futuramente essa tão necessária benesse será graciosamente derramada por toda a cidade.

Ora, por muito que eu acredite que as ditas passadeiras sinalizadas, e creiam-me sincero, são obra importante, digna claro está, de figurar fulgurante pelas redes sociais, com a habitual enxurrada de comentários sabujos, onde com encómios mais ou menos labregos se louvam as portentosas mentes que criam em si tais ideias fantásticas que tanto nos distinguem do resto da ralé nacional, não cesso porém de pensar, ousadia que confesso muito de quando em quando fazer, que talvez existissem quaisquer outras prioridades em que fizesse mais sentido desbaratar dinheiro, mas que se calem as negras parcas e os arautos do miserabilismo, Almeirim vai ter passadeiras sinalizadas para cegos, a urbe vai ombrear com o progresso e com o avanço mais refinado que este Mundo já viu, nada travará a sua senda progressista, a invejosa Paris olha-nos já de soslaio, a maviosa Berlim ri com desdém, enquanto a pérfida Londres se apressa a copiar-nos.

Entrevejo apenas um pequeno engulho, naquilo que é uma obra de perfeição divina sinal da preclara intuição dos sábios que nos governam, é apenas um detalhe do somenos importância, que se prende com o facto de um cego, se “ver” e desejar para chegar a uma dessas passadeiras, para então poder atravessar a rua em segurança, digo isto porque, se há terra em que a mobilidade das pessoas portadoras ou não de algum tipo de deficiência motora, permanente e ou temporária, seja posta em causa a cidade de Almeirim é seguramente uma delas.

Um cego que ande aí pela cidade, tem pela frente uma verdadeira prova de obstáculos, tem de superar tormentas e fazer prodígios para conseguir chegar a uma dessas passadeiras, passeios exíguos, pejados de troçulhos caninos, com desníveis perigosos a ruas de calhaus rolados que dificultam a locomoção, inclusivamente dos que não são cegos, passeios atulhados de carros, atulhados de carrinhos e carretas estacionados lá em cima, atulhados de contentores do lixo, atulhados de sinais de trânsito, de postes de iluminação, de todo o tipo de caixotes, caixas e caixinhas, de motos e motoretas mais bicicletas e trotinetas que circulam por cima dos passeios alegremente até estendais com roupa secar existem nos passeios, tudo isto obrigando as sair do passeio e ter de ir pela rua arriscando-se a levar com o carro de um qualquer alucinado dos muitos a quem é permitido conduzir, acaso tal não baste ainda temos veículos estacionados ou a circularem em sentido proibido, fazendo com que a grande horda de cegos de Almeirim tenha dificuldades em saber orientar-se, ora se o bravo cego sobreviver a isto tudo, poderá então eventualmente chegar até uma dessas passadeiras, atravessando a rua em relativa segurança, mas atenção que os condutores locais tem alguma aversão às passadeiras.

Resumindo, agora assim munidos desta excelente ferramenta “as passadeiras sinalizadas” a gigantesca comunidade de cegos de Almeirim, está definitivamente apetrechada para enfrentar com garbo e de modo seguro o atravessamento das ruas, ainda infelizmente poucas, que possuem tais inovações, sendo que por exemplo um bairro de ruas empedradas com calhaus a esmo nem passadeiras possui, tal percebe-se porque como mal dá para andar não são precisas passadeiras. Calem-se pois os “velhos do Restelo” as catatuas da desgraça, Almeirim vai ter passadeiras sinalizadas para cegos”. Esperamos com ansiedade mais avanços tecnológicos que farão arrancar esta terra antecipadamente para o século XXII, liderados pelos faróis do intelecto, esses verdadeiros furões da omnisciência cognitiva e da sapiência que desinteressada e magnanimamente derramam a sua douta e mui preclara mente no acto caridoso de nos governar, a nós pobres e patéticos seres.

Francisco Pereira

1 https://www.almeirinense.com/2022/03/30/almeirim-vai-ter-passadeiras-sinalizadas-para-cegos/?fbclid=IwAR0yIlOyW3PNH_WYV3rOlpnvRPEALe-VLBcdeMFG0mbtOBLW9L5VsuVZ0Ps

 

 

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