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A ARMA “INFORMAÇÃO”

01-04-2022 - Francisco Garcia dos Santos

Em tempos “normais” e/ou de conflitos políticos e militares, a “informação”pode dividir-se em duas acepções: a intelligence, ou seja, a recolha de informações por parte de serviços secretos de uma parte relativa à sua opositora; informação divulgada publicamente por uma das partes pelos meios de comunicação social e outras formas, como as redes sociais. (*)

No que concerne à intelligence, a mesma procura obter o máximo de informação possível e credível sobre factos e realidade do oponente para utilização do seu próprio Estado, sendo que parte da mesma é “reservada” ou secreta, e outra para divulgação pública, visando o apoio interno e externo das opiniões públicas para a sua causa.

Quiçá o primeiro grande estudioso e praticante da intelligence tenha sido o florentino Niccolò Machiavelli (1469-1527), autor do famoso tratado da política “O Príncipe” dedicado ao seu patrono e “patrão” Lorenzo I de Medici Duque de Urbino, o Magnífico(1449-1492), banqueiro e governante da República de Florença. Com efeito, Machiavelli foi simultaneamente diplomata e “espião” de Lorenzo I, recolhendo para este “informação” para o mesmo utilizar em termos políticos e segundo os “conselhos” por si dados ao seu Príncipe com vista à respectiva manutenção do poder e enfrentar os seus rivais, o que conseguiu com notável êxito, já que esta família ou dinastia governou a República de Florença e,no final, o Grão-Ducado da Toscana e Ducados de Florença, Urbino e Némours, desde meados do Séc. XV até ao Séc. XVIII.

Dando um “salto” no tempo, António Gramsci (1891-1937), outro italiano, mas marxista-bolchevista, Secretário-Geral do Partido Comunista de Itália, foi outro estudioso e teórico da “informação”, porém não a intelligence mas sim a que é divulgada publicamente, quer pelos meios de comunicação social como transmitida no meio escolar, com vista à influência transformadora das mentes e da sociedade.

Seguidamente, Joseph Goebbels (1897-1945), Ministro da Propaganda de Adolf Hitler, aprofundou e pôs em prática com grande êxito a “informação” pública, sobretudo para“consumo interno”, arregimentando a opinião da grande maioria dos alemães a favordo Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP – “Nazi”).

Desde então, a “informação” nas duas vertentes supra mencionadas tem vindo a seraperfeiçoada e utilizada pelos Estados em tempos de paz e de guerra, tendo-se tornado em nossos dias uma “arma” poderosíssima, tão ou mais eficaz como o são mísseis de última geração, colunas de tanques e de infantaria mecanizada, aviação e demais parafernália bélica.

Efectivamente, basta lembrar por todas a “informação” sobre a Guerra do Vietnam nos Estados Unidos da América, que motivou a oposição da respectiva opinião pública contra a mesma e a retirada americana, bem como mais recentemente do Afeganistão.

Serve isto para analisar a “informação” sobre a guerra que há mais de um mês lavra na Ucrânia.

Da parte ucraniana, o Presidente Zelinsky tem vindo a desdobrar-se diariamente emcomunicados e vídeos difundidos pela comunicação social internacional sobre as vítimas civis, entre elas crianças, ataques a escolas, hospitais, etc., e suas aspirações e realidade no terreno, com apelos à resistência interna ao invasor russo e à comunidade internacional para ajuda humanitária, militar e imposição de sanções à Federação Russa, inclusive concedendo uma entrevista a uma cadeia de televisão deste Estado a 27-03-2022, a qual “furou” a censura legal imposta pelo Kremlin aos media no que concerne anotícias e posições favoráveis à Ucrânia. Assim, o Presidente ucraniano tem obtido um extraordinário êxito no uso da “informação”, o qual vai desde o apoio político, económico e militarpor parte deorganizações internacionais, como a ONU,Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, União Europeia e NATO, e de Estados importantes na cena mundial, como a Austrália, Coreia do Sul, Japão e a neutral Suíça,mormente no que concerne à aplicação de sanções económicas e/ou comerciais à Federação Russa, a altos funcionários da mesma e aos principais multimilionários (“oligarcas”) russos próximos de Putin, mediante congelamento dos seus bens nesses países e restrições à respectiva entrada ou movimentação nos mesmos; de igual modoa exclusão da Rússia e seus atletas e desportistas de várias competições internacionais, desde FIA (Grande Prémio de Formula 1) à UEFA e FIFA (a selecção russa não participará no Campeonato do Mundo de Futebol de 2022); por fim a cativação das opiniões públicas da maioria dos Estados ocidentais e seus aliados ou parceiros pelo mundo fora, o que se tem traduzido numa grande multiplicidade e frequência de acções de rua em apoio da Ucrânia e condenação da Federação Russa.

Já no que respeita ao Presidente Putin parece ter vindo a ser pouco hábil no uso da “informação”, uma vez que as suas poucas intervenções televisivas têm sido mais dirigidas ao Povo (ou Povos) russo, ou seja, “para consumo interno”, do que para o exterior, e quando o faz é sempre em termos algo “antipáticos”, focando-se na mera intimidação, como o anúncio explícito de que, se necessário, recorrerá a armas nucleares. De igual modo, o estado-maior militar russo, mediante o respectivo porta-voz, não gera qualquer empatia, limitando-sea fazer comunicados frios e secos, anunciando as vitórias russas mas calando as respectivas baixas e desaires no teatro de operações, como as mortes de vários generais no mesmo (diz-se que já serão sete).

Posto isto, Putin e a Federação Russa já perderam há muito a “guerra da informação”, restando saber qual o desfecho da guerra propriamente dita e suas consequências numa eventual, mas quase certa, recomposição geopolítica no Leste da Europa, mas isso será outra estória.

Nota: (*) sobre “Informação”, vide por todos General Loureiro dos Santos, “As Guerras Que Já Aí Estão e As Que Nos Esperam” e “História Concisa de Como Se Faz a Guerra”, Ed. Europa América, e Coronel Armando Carlos Alves, “Adivinhar Perigos” e “Introdução à Segurança”, Ed. Revista da GNR.

Francisco Garcia dos Santos

 

 

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