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DESTRUIÇÃO DA LÍBIA PELA NATO, UM MODELO DE «INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA» QUE ESTÁ A SER APLICADO NA SÍRIA E NA UCRÂNIA

05-09-2014 - Alfredo Barroso

Na Líbia, a NATO desorganizou e destruiu efectivamente uma nação inteira. A acção da NATO na Líbia reduziu o país a montanhas de ruínas fumegantes, para que empresas ocidentais possam, não só pilhar os recursos nacionais, mas, também, usar o «modelo líbio» com o padrão de futuras acções extra-territoriais na Síria, Egipto, Ucrânia e agora, novamente, no Iraque.

A Líbia está já a considerar um deslocamento de forças internacionais para restabelecer a segurança, agora que a violência recomeçou em Tripoli, e dezenas de mísseis destruíram quase toda a frota de aviação civil naquele aeroporto internacional. «O governo analisa a possibilidade de solicitar que forças internacionais sejam enviadas para actuar no terreno, restabelecer a segurança, e ajudar o governo a impor a sua autoridade» – disse um porta-voz do governo na Líbia, Ahmed Lamine.

OS «PROXIES» DA NATO CANIBALIZAM-SE ENTRE SI

Em maio de 2014, a luta na cidade de Benghazi no leste da Líbia já deixara incontáveis mortos, muitos e muitos feridos e legiões de moradores obrigados a abandonar as próprias casas para não morrer, quando um «general renegado» fazia a guerra contra «militantes islamistas» dentro da cidade. Num artigo intitulado «Famílias evacuam Benghazi, e general renegado ameaça com novos ataques», a agência Reuters escreveu:

«O auto-declarado Exército Nacional Líbio, liderado por um general renegado, disse a civis no sábado que abandonassem bairros de Benghazi antes de ele iniciar ali mais um ataque contra militantes islamistas, um dia depois de ali ter havido dezenas de mortos, nos mais violentos confrontos na cidade em meses».

O general renegado é Khalifa Haftar (às vezes também referido como «Hifter»), que morou durante anos nos EUA, nos arredores de Langley (Virgínia), ao que se crê a ser treinado pela CIA, até que regressou à Líbia em 2011 para comandar as forças de invasão da NATO. Num artigo de 2011, o Business Insider informava: «O general Khalifa Hifter é o homem da CIA na Líbia?»:

«Desde que chegou aos EUA, no início dos anos 1990, Hifter morou nos arredores de Langley (Virgínia), próximo de Washington DC. Badr disse que nunca entendeu exactamente o que Hifter fazia para viver, e que a principal preocupação de Hifter sempre fora ajudar a sua grande família.

«Ou sejar: trata-se de um ex-general de Kaddafi, que muda de lado e passa a trabalhar assumidamente para os EUA, instala-se na Virgínia, próximo de Washington D.C. e consegue apoiar a sua grande família (?) na Líbia, mas alguém que o conheceu ao longo de toda a vida diz que “nunca percebeu exactamente quem ele é”.

É altíssima a probabilidade de que Hifter tenha sido comprado para trabalhar a favor dos EUA. Assim como figuras como Ahmed Chalabi foram “preparadas” para um Iraque pós-Saddam, Hifter pode perfeitamente ter desempenhado um papel semelhante como agente secreto dos EUA, à espera de um momento para agir na Líbia».

A ironia deste “contrato” é que muitos dos guerrelheiros sectários contra os quais Hifter está em luta em Benghazi são os mesmos guerrilheiros contra os quais Muammar Kaddafi se opôs ao longo de décadas como líder da Líbia; e são os mesmos guerrilheiros que a NATO armou e organizou, com Hifter, para induzir a queda de Kaddafi em 2011.

Sobre sua própria guerra em Benghazi, Hifter disse que ela continuará «até que não reste nenhum terrorista em Benghazi»: «Começámos esta batalha, que prosseguirá até alcançarmos os nossos objectivos. A rua e o povo líbio estão do nosso lado». Os sentimentos de Hifter são um eco perfeito do que dizia Muammar Kaddafi em 2011. Diferente, só o facto de a imprensa ocidental ter negado, ao longo de décadas, que houvesse qualquer terrorista em Benghazi, e ter sempre apresentado as operações de Kaddafi em Trípoli como «um massacre» de «pacíficos menifestantes pró-democracia».

A NATO DESTRUÍU A LÍBIA

As mesmas atrocidades que a NATO apontou, de início, como «causa» da sua «intervenção humanitária» na Líbia, imediatamente passaram a surgir como práticas da própria NATO, designadamente das forças que a NATO apoia e arma no terreno. Cidades inteiras foram cercadas, passando fome, submetidas a bombardeamentos aéreos até capitularem. Em outras cidades, populações inteiras ou foram exterminadas ou evacuadas ou, em alguns casos, «empurradas» para fora das fronteiras líbias. A cidade de Tawarga, onde viviam cerca de 10 mil líbios, foi totalmente destruída, a ponto de o London Telegraph referir-se a ela, hoje, como uma «cidade fantasma».

Desde a queda de Tripoli, de Sirte e de outras cidades líbias que resistiram à invasão dos «proxies» da NATO, pouco sobrou em termos de estabilidade básica, muito menos a prometida «revolução democrática» da NATO e dos seus «protegidos» que voltaram para a Líbia. O governo em Tripoli continua caótico, as forças de segurança divididas entre si, e agora um «rogue» agente da CIA está a realizar uma operação militar em larga escala contra Benghazi, incluindo o uso de aviões militares, aparentemente sem a aprovação de Trípoli.

Anos depois da conclusão da dita ‘revolução’, a Líbia continua sua trajectória forçada na direcção do mais completo atraso. As grandes realizações do governo de Muammar Kaddafi já foram desmontadas há muito tempo e é pouco provável que venham a ser restauradas, e muito menos resolvidas num em futuro previsível. A NATO efectivamente desorganizou e destruiu uma nação inteira, deixando-a não só a arder enquanto as corporações ocidentais saqueiam os seus recursos, mas também para ser usada como um modelo para futuras aventuras extra-territoriais na Síria, Egipto, Ucrânia, e agora o Iraque.

«MODELO LÍBIO» APLICADO À SÍRIA, À UCRÂNIA, AO EGIPTO

Tal como foi feito na Líbia, também se tentou fazer «revoluções» semelhantes no Egipto, na Síria e na Ucrânia. As mesmas narrativas, palavra por palavra – inventadas para a Líbia nos think-tanks políticos, nas redacções dos órgãos de comunicação social, e nas «análises» dos especialistas ocidentais – estão a ser agora reutilizadas para o Egipto, a Síria e a Ucrânia. As mesmas organizações não-governamentais (ONGs) estão a ser usadas como meio para fazer chegar dinheiro, armamento e outras modalidades de apoio aos grupos de oposição, em cada um desses países. Termos como «democracia», «progresso», «liberdade» e luta contra a «ditadura» são frequentes. Não houve protestos que não tenham sido acompanhados por guerrilheiros armados, e sempre apoiados pelo Ocidente.

Na Síria, os protestos foram instrumentalizados e «vendidos» como acções de «combatentes da liberdade». Os media ocidentais consomem agora muito do seu tempo «spinning and justifying why NATO and its regional partners are funding and arming sectarian militants», inclusive a Al Qaeda, para que tentem derrubar o governo sírio.

No Egito, ainda há alguma ambiguidade, tal como houve também em 2011 no caso da Síria, sobre quem realmente são os manifestantes, o que realmente querem e de que lado do conflito cada vez mais violento estão as «simpatias» do Ocidente. Mas uma análise atenta mostra que, assim como a Irmandade Muçulmana foi usada na Síria para montar o cenário para a guerra devastadora que se seguiu, a Irmandade Muçulmana no Egipto também está a ser usada, praticamente do mesmo modo, contra o Cairo.

Finalmente, na Ucrânia, os manifestantes apresentados no Ocidente como «pró-democracia», «pró-União Europeia», «pró-NATO» - os «Euromaidan» - já foram identificados como neo-nazis, ultras da direita e nacionalistas, conhecidos por recorrer regularmente à violência e à intimidação política. Exactamente como se viu na Síria em 2011, e no Egipto agora, confrontos armados de baixa intensidade em direcção ao que pode acabar por ser uma guerra por procuração entre a NATO e a Rússia na Europa Oriental.

Mas para estas três nações, e os seus participantes em todos os lados, o estado actual da Líbia deve ser seriamente examinado. Estas «revoluções» têm apenas uma conclusão lógica e previsível: o saque, divisão e destruição de cada um desses países, antes de serem «integrados» na omnipotente ordem supranacional de Wall Street e Londres, e de serem explorados indefinidamente tanto pelos EUA, como pelo Reino Unido e pela União Europeia, como já hoje acontece.

Para os que quiserem saber o que será do Egipto, da Síria e da Ucrânia, bastará olhar para o «caso de sucesso» da NATO na Líbia. E aos que apoiaram a «revolução» na Líbia, deve-se perguntar se estão satisfeitos com o seu resultado final. Será que também desejam este resultado para o Egipto, a Síria e a Ucrânia? Será que julgam que os planos da NATO para cada um destes países vai acabar de forma diferente?

Alfredo Barroso

 

 

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