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Há dias assim

17-04-2020 - Armando Alves

Há dias em que o coração não bate, o sol não brilha, a vontade não chega. Dias que mesmo longe de acabarem já não valem a pena. Dias que são mais cumpridos que vividos. Um dia, estes dias não terão qualquer valor. Dificilmente encontram lugar na memória de modo individual. Certamente se juntam a outros dias assim para relembrar apenas que eles existem. Memórias em que nos lembramos do que sentimos, mas não do que vimos, de onde estivemos, do que vestimos. Mas enquanto decorre, dias assim absorvem todas as outras memórias e corrompem-nas com o mesmo sentimento.

Há dias em que nem a própria tristeza se digna a impor. Está lá, presente, a um canto, quieta. Quase como uma companhia. Uma leve tristeza que acompanha o tom do dia. Há uma névoa muito suave que pinta de pálido todas as cores, que abafa levemente todos os sons. Há paz nestes dias. Mas é triste, como o satisfatório final de um filme sem final feliz. Um sentimento de aceitação de que algo não está bem, mas que essa é a realidade que se apresenta. Há, no entanto uma desilusão que não chega a causar revolta. Uma desilusão para com o hoje, que ontem era um promissor amanhã para o qual olhávamos com esperança. “Amanhã será melhor” murmuramos a nós próprios, mas muito baixinho, pois lembramo-nos de que ainda ontem pensámos isso sobre hoje.

Há dias que têm um motivo para ser assim. Não é desses que falo. Falo de dias abandonados pela razão. Dias em que se nos perguntarem o que se passa e respondermos “nada” não estaremos a mentir. “Anima-te” é uma frase pesada em dias assim. Como se de uma opção se tratasse. Podemos fingir animar-nos para poupar outros à nossa condição. Talvez seja isso que a frase significa no fundo, “disfarça”.

Abençoada seja a rotina, essa rotatividade de tarefas diárias de que nos conseguimos convencer em dias melhores de que têm de ser cumpridas, aconteça o que acontecer. Se tivermos a sorte de ter criado um conjunto de rotinas saudáveis, e a disciplina de não questionar fazê-las, apesar do hoje não sorrir, teremos então algo a conquistar. Pequenas vitórias às quais não damos atenção quando exigem menos esforço do que em dias assim. Como um relógio pessoal, quando o tempo comum não nos diz nada. Talvez seja a rotina, da qual tanto se houve amaldiçoar, que segure de pé o ser sem vontade de cumprir o dia.Abençoada seja a rotina, essa rotatividade de tarefas diárias de que nos conseguimos convencer em dias melhores de que têm de ser cumpridas, aconteça o que acontecer. Se tivermos a sorte de ter criado uma conjunto de rotinas saudáveis, e a disciplina de não questionar fazê-las, apesar do hoje não sorrir, teremos então algo a conquistar. Pequenas vitórias às quais não damos atenção quando exigem menos esforço do que em dias assim. Como um relógio pessoal, quando o tempo comum não nos diz nada. Talvez seja a rotina, da qual tanto se houve amaldiçoar, que segure de pé o ser sem vontade de cumprir o dia.

Todos os dias terminam. Dias assim não são exceção. Demoram mais, mas terminam. Talvez o propósito de dias assim seja apenas sobreviver. Relembrar-nos de que conseguimos. Uma vitória individual sem qualquer traço de ego, pois aos outros não será fácil compreender. Tal como não damos a devida importância aos dias assim dos outros. É fácil esquecer que temos dias assim quando hoje passa a ontem. Mas a verdade é que quem tem dias assim, ignora a sorte que têm. Muitos seres, autênticos soldados silenciosos, têm semanas assim. Meses assim. Anos assim. Uma vida assim.

Armando Alves

 

 

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