Edição online quinzenal
 
Quarta-feira 10 de Setembro de 2025  
Notícias e Opinião do Concelho de Almeirim de Portugal e do Mundo
 

Sai um banco público para cidadão pagar

28-03-2014 - Ana Sá Lopes e Margarida Bon de Sousa com N.A.

Pagámos muito para salvar os bancos, continuamos a salvar banqueiros

No início do seu trajecto como candidato a líder do PSD, Pedro Passos Coelho apareceu com uma proposta fulminante – o homem que queria fazer o Estado desaparecer das nossas vidas, desejava naturalmente, privatizar a Caixa Geral de Depósitos. Perante o clamor nacional, Passos mudou de ideias. Afinal, "a Caixa era a Caixa" e nunca lhe tinha passado pela cabeça a relação especial que os portugueses mantinham com "a Caixa".

Agora, o governo decidiu criar um segundo banco público. Desta vez, é um Banco de Fomento que vai ajudar a conceder crédito às empresas. A ideia até tem o apoio do PS que a defendeu antes do governo. Alguns economistas – como o insuspeito Mira Amaral – defendem que o que este banco vai fazer podia perfeitamente ser feito pela Caixa Geral de Depósitos, um organismo que faz de público em determinadas ocasiões e de "banco comercial" em outras.

Mas lá se avançou para a comissão instaladora do Banco de Fomento, que irá revolucionar a economia portuguesa (como se alguma coisa, infelizmente, conseguisse fazer isso perante as obtusas regras europeias a que estamos obrigados). Acontece que os vencimentos anunciados para os membros da comissão instaladora do banco público revelam mais uma vez ao mundo que as "gorduras do Estado" que o governo jurou combater eram a arraia--miúda, os reformados e os funcionários públicos. As "gorduras" do Estado eram os serviços públicos e os pensionistas com reformas acima dos 600 euros. Não há dinheiro para nada, mas há dinheiro para pagar quase um milhão de euros a três criaturas que vão "instalar" o segundo banco público do país. Maria Antonieta também pensava assim.

O argumento de que se tem de pagar muito bem porque se tem de ir buscar "os melhores" é iníquo no meio da devastação social a que o país está sujeito. E quem são os melhores? E onde está a lei que tinha travado salários no Estado superiores aos do Presidente da República? E se é suposto que um primeiro-ministro seja "um dos melhores" porque lhe é imposto um rendimento tão baixo em comparação com o banqueiro? Até aqui, pagámos muito (com uma crise e desemprego elevado) para salvar os bancos. Continuamos a salvar banqueiros. Os cortes que vêm aí não vão incidir sobre o salário destes novos banqueiros públicos – vão voltar aos do costume, aos ricos que têm rendimentos de 1000 euros brutos. Anda-se a brincar com o fogo.

Novo banco público. Três membros da comissão instaladora ganham meio milhão de euros por ano

Despacho da ministra das Finanças foi conhecido na mesma altura em que o país soube que vão ser cortados mais 1500 milhões a 1700 milhões de euros na despesa, durante o próximo ano.

Quase meio milhão de euros por ano é quanto vão custar os salários de apenas três dos membros da comissão instaladora da nova Instituição Financeira de Desenvolvimento, ou Banco de Fomento, como é vulgarmente conhecido. Os números foram conhecidos quase em simultâneo com o anúncio de novos cortes na despesa para 2015 entre os 1500 milhões e 1700 milhões de euros, os quais deverão recair novamente nos salários públicos, nas pensões e nos apoios sociais.

O despacho assinado pela ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, e publicado na sexta-feira, fixa o ordenado de Paulo Pereira da Silva (administrador do BCP) em 13 500 euros por mês, mesmo assim metade do que ganhava no privado, o da vogal Carla Chousal (vice presidente do BPI Gestão de Activos) em 12 515 euros e o do vogal Nuno Ferreira Soares (director da banca de investimento do BCP) nos 8034 euros.

Em declarações ao i , o presidente do BIC, Mira Amaral, considerou justo que os administradores do novo banco recebam o mesmo do que nos seus lugares de origem mas voltou a questionar se faz sentido criar-se um novo banco público quando já existe a Caixa Geral de Depósitos. "A banca comercial está pouco aberta a financiamentos de maturidades muito longas", disse, "e a banca comercial não está vocacionada para a recapitalização das empresas, que é essencial ser feita. Isso justificaria alguma intervenção pública mas já existe um banco estatal".

Para Mira Amaral, o facto de se ter optado pela abertura de outro banco público implica pagar-se de acordo com os vencimentos do mercado. "O que não faz sentido é que haja administradores na Caixa Geral de Depósitos que ganhem menos do que os directores porque têm os seus vencimentos indexados ao salário do primeiro-ministro, enquanto estes últimos recebem pela tabela salarial dos trabalhadores bancários. É o habitual miserabilismo português".

Quem já se manifestou totalmente contra as remunerações dos membros da comissão instaladora do Banco de Fomento foi Jerónimo de Sousa, o secretário- -geral do PCP, afirmando que isso demonstra a natureza desta classe política e deste governo.

"É inaceitável, eu diria que é chocante para muitos portugueses que viram os seus salários cortados, que são de mil euros, 900 euros ou 600 euros, que por razões directas de impostos ou de cortes verificam o seu salário cada vez mais a valer menos", afirmou Jerónimo de Sousa aos jornalistas, à margem de uma cerimónia de homenagem a Óscar Lopes, que decorreu em Matosinhos.

"E depois vem o governo, que está sempre a falar de que os sacrifícios são para todos, de que há uma equidade de sacrifícios, e vem um administrador de um banco a ganhar 13 500 euros por mês", criticou Jerónimo de Sousa. O comunista questionou "como não se sentirá um trabalhador a quem negam o aumento do salário mínimo nacional ao ouvir este número, fica ou não chocado ?".

VERBAS COMUNITÁRIAS

O novo Banco de Fomento vai gerir o pagamento de todos os fundos comunitários. A génese da sua constituição partiu de Vítor Gaspar, quando este era ministro das Finanças, que desta forma quis ficar com a tutela plena das verbas do próximo Quadro Comunitário de Apoio até 2020 e que sempre estiveram distribuídas entre diversos ministérios.

Basicamente, a nova instituição vai integrar todas as operações de apoio financeiro às PME e multiplicar a capacidade de apoio na vertente de financiamento quer em capitais próprios quer em capitais alheios. O que se espera é que a combinação do que existe mais a utilização de fundos comunitários e ainda o acesso a linhas de financiamento do BEI, do KfW, entre outras instituições financeiras internacionais, permita uma maior capacidade de intervenção do que a que actualmente existe.

E, embora para já não esteja previsto que nenhum dos bancos internacionais associados injectem capital no novo instrumento público, espera-se que a instituição possa vir a negociar linhas de crédito a taxas de juro mais baixas do que as do mercado e intermediar a sua colocação junto da banca comercial. A vantagem é que, sendo uma instituição pública, tenha maior poder negocial e transmita essa vantagem às PME, melhorando inclusive o seu acesso à banca comercial.

Para fontes contactadas pelo i, o modelo faz sentido, uma vez que acima de tudo vai potenciar a experiência já existente e gerir de forma integrada recursos que até agora estavam dispersos e que nem sempre eram aplicados de forma optimizada. Por outro lado, o novo banco tem como objectivo encontrar forma de apoiar a recapitalização das Pequenas e Médias Empresas, um dos maiores problemas com que se defronta o tecido produtivo nacional e que não tem encontrado resposta nos tradicionais meios de financiamento.

O novo banco promete também inovar em termos de desburocratização dos processos de pagamento, embora as novas regras aprovadas por Bruxelas, no que diz respeito à aprovação de apoios financeiros, tenham sido alteradas, prevendo-se agora estudos prévios justificativos da despesa em função de resultados quantitativos e qualitativos. Ou seja, embora se preveja um maior afluxo de trabalho para as instituições envolvidas nos processos de aprovação das candidaturas, espera-se que para as empresas as relações sejam mais escorreitas e mais simples do que têm sido até agora.

A instituição vai ser um banco grossista, ou seja não vai ter balcões e, portanto, o empresário não se vai dirigir a este banco a pedir empréstimos, mas sim ao seu banco habitual, e é este quem depois se vai financiar junto do Banco de Fomento ou obter garantias suplementares ou bonificações de taxas de juro.

Jornal i

 

Voltar 


Subscreva a nossa News Letter
CONTACTOS
COLABORADORES
 
Eduardo Milheiro
Coordenador
Marta Milheiro
   
© O Notícias de Almeirim : All rights reserved - Site optimizado para 1024x768 e Internet Explorer 5.0 ou superior e Google Chrome