"Tribunal de Contas deteta gastos excessivos no Tribunal Constitucional"
24-04-2015 - Pedro Sales Dias e Maria João Lopes
Primeira auditoria alguma vez feita ao TC coloca em causa a "fiabilidade" da prestação de contas do tribunal e aponta várias irregularidades.
A primeira auditoria alguma vez feita ao Tribunal Constitucional (TC) revelou um descontrolo financeiro nas contas daquela instância superior. O cenário retratado pelo Tribunal de Contas (TdC), naquela que é a última auditoria a tribunais superiores – antes foi fiscalizado o Supremo Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Administrativo –, é o de desorganização nas contas do Constitucional relativas a 2013.
A auditoria, revelada esta terça-feira no site do TdC, considera “desfavorável” a “fiabilidade dos documentos de prestação de contas” desse ano face a erros e irregularidades. Entre estes, o TdC destaca o facto de o sistema de controlo interno do tribunal fiscalizado ser “deficiente”, de não existir um manual de procedimentos de controlo interno, assim como o de não se registar o cumprimento dos “princípios e regras orçamentais” relativamente a 1,4 milhões de euros no âmbito da “contabilização da receita e da despesa no orçamento”.
Em comunicado, o Tribunal Constitucional regista “com preocupação” que se formulem “infundadas conclusões” e emitam “recomendações aparentemente assentes em deficiente compreensão do seu estatuto constitucional próprio, do qual decorre a sua autonomia administrativa e financeira”. Em resposta, o presidente do TC, Joaquim Sousa Ribeiro, garante que vão corrigir “com a brevidade possível” as situações que possam “estar em desconformidade” e foi com “verdadeiro desgosto” e “preocupação” que reagiu ao relatório da auditoria: “Seguramente injusto perante o que é a realidade” e a “gestão financeira” do TC, diz.
Fica também claro no relatório que o TC não contabilizou nas suas contas 13 mil euros correspondentes ao accionamento de garantias bancárias assim como a transacção de 21 mil euros em gastos.
O exame às contas do TC permitiu também perceber que cada um dos 13 juízes conselheiros tem direito a um automóvel do tribunal para uso pessoal desde o ano 2000. Além das viaturas, são ainda entregues cartões de combustível e de via verde, porém, o TdC salienta que apenas o presidente e o vice-presidente do TC têm direito a veículo oficial, não existindo regulamentação sobre o uso de veículos de serviços gerais para os restantes juízes.
O TC responde que a lei prevê que pode ser “afectado ao uso pessoal de cada juiz” um carro da frota do tribunal, que pode ser conduzido pelo próprio, “designadamente enquanto o quadro de pessoal do tribunal não estiver dotado de um número de motoristas suficiente para a condução de cada uma dessas viaturas”.
Joaquim Sousa Ribeiro alega ainda, numa extensa resposta, que “nos tribunais dotados de autonomia administrativa e financeira compete ao presidente regular, por despacho, a utilização pelos magistrados dos veículos da respectiva frota”. No caso concreto, afectar aos magistrados um veículo foi uma “solução mais económica para o Estado, pois a alternativa seria a entrada ao serviço de mais onze motoristas”, lê-se.
As irregularidades verificam-se ainda no pagamento do subsídio de refeição que os juízes recebem em acumulação com as ajudas de custo por participação em cada sessão do tribunal. O TdC considera que essa acumulação se regista sem “conformidade legal”. Os magistrados não poderiam acumular as verbas pelo que o “abono diário do subsídio de refeição” teria de ser descontado. O pagamento global aos juízes de 12.329 euros a esse título entre Novembro de 2012 e Dezembro de 2013 é ilegal e “resultaram num dano efectivo para o erário público”.
Joaquim Sousa Ribeiro ressalva, contudo, que “até ao presente, nunca as falhas e as deficiências” trouxeram “perdas patrimoniais para o Estado”. O magistrado considera ainda que “uma vez que a ajuda de custo é abonada por cada dia de sessão do tribunal em que os juízes participem, e por mais dois dias por semana, independentemente da deslocação implicar almoço, jantar ou dormida, não pode afirmar-se que, neste caso, o pagamento da ajuda de custo corresponda ao pagamento de duas refeições e alojamento”.
Nesse ponto, o TdC aponta precisamente entre os responsáveis pela infracção sancionatória continuada o presidente do TC, Joaquim Sousa Ribeiro, e a secretária-geral do Constitucional, Maria Lopes.
O TdC sublinha ainda que o Constitucional pagou os suplementos de disponibilidade permanente a dois dirigentes sem um despacho de autorização que mesmo existindo não teria “suporte legal”. A auditoria considera igualmente que o suplemento de forças de segurança pago a guardas da GNR e o pagamento de suplementos de risco e de disponibilidade permanente a agentes da PSP foram pagos indevidamente (todos eles motoristas ao serviço do TC).
Fonte: Público.pt
Voltar |