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Tribunal europeu rejeita queixa de jovens portugueses contra 32 países por inação ambiental

12-04-2024 - TSF

O tribunal deliberou que os requerentes não esgotaram todas as vias legais que tinham em Portugal antes de recorrerem a esta instância europeia.

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) rejeitou a queixa apresentada por seis jovens portugueses contra 32 países, incluindo Portugal, por inação na luta contra o aquecimento global.

Na leitura da decisão, em Estrasburgo (França), o TEDH decidiu que o processo é inadmissível no que diz respeito à jurisdição extraterritorial dos países mencionados.

O tribunal deliberou também que os requerentes não esgotaram todas as vias legais que tinham em Portugal antes de recorrerem a esta instância europeia.

Em declarações à TSF, Lara Roque Figueiredo, vice-presidente da Ordem dos Advogados, lamenta esta decisão, mas recusa falar em derrota.

"É uma desilusão porque efetivamente pensávamos que seria possível a chamar a atenção para este assunto tão importante através desta via. Percebi que um dos argumentos será efetivamente um erro na jurisdição, portanto, terão de ir através do caminho interno. Sabíamos que havia esta possibilidade, mas não é uma derrota. Foi importante fazer este caminho para que se discutam estes temas que são de extrema importância", considera.

Depois desta decisão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, há outros caminhos que podem ser seguidos.

"Agora é encontrar outro mecanismo jurídico que proteja aqueles interesses - e eles existem internamente em Portugal - e conseguir chegar à União Europeia. É uma pena que efetivamente não se tenha reconhecido a emergência do tema, mas efetivamente nós sabíamos que era uma possibilidade", sublinha.

Viriato Soromenho Marques, professor na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, não encara a decisão do tribunal como uma derrota.

"Eu penso que o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos foi o mais longe possível e concordo com os jovens que colocaram esta ação dizendo que só o facto de ela ter chegado a este ponto já é uma vitória. O essencial é tentar perceber porque é que o tribunal não pôde ir mais longe. O próprio tribunal refere que existe uma contradição absoluta entre a realidade do mundo em 2024 e o direito internacional que prevalece ainda em 2024", diz, em declarações à TSF, sublinhando que a decisão dos juízes só podia ser esta.

"Eu julgo que os juízes foram corajosos e levaram ao máximo da letra o espírito que está em causa nesta ação. O que está em causa é o nosso futuro colectivo, sobretudo das gerações mais jovens, e a total inadequação entre o direito internacional e os problemas que estão a ser criados pelo nosso modo de vida, pelo nosso modo de economia, pelo egoísmo e cegueira dos Estados. Como é que o direito nacional trata, por exemplo, a atmosfera e os oceanos? Como se fossem uma lixeira", reforça.

No entender do antigo presidente da Quercus, desta decisão resulta também a ideia de que as leis que existem já não servem.

"Esta recusa de proceder com a ação coloca o dedo na ferida da situação de naufrágio jurídico em que nos encontramos todos. Nós vivemos num planeta em que a Humanidade é hoje a grande força plástica da alteração das condições biofísicas. Os 8000 milhões de seres humanos têm uma tecnologia absolutamente devastadora no seu poder, uma tecnologia que nós já não conseguimos sequer controlar. E o direito que prevalece foi forjado no século de XVII antes da Revolução Industrial, portanto, nós temos aqui uma verdadeira cisão patológica entre o direito que regula o mundo e a verdade objetiva deste mundo, que nada tem a ver com esse direito", acrescenta.

O TEDH considerou que não era possível imputar a uns países fenómenos climáticos adversos ocorridos em outros Estados, considerando que uma deliberação nesse sentido, ainda que exclusiva a processos relacionados com as alterações climáticas, ia abrir um precedente com implicações inimagináveis, já que colocava em causa a soberania e as limitações geográficas de cada país.

André, Catarina, Cláudia, Mariana, Martim e Sofia, nascidos entre 1999 e 2012, invocaram "circunstâncias excecionais" para apoiar a argumentação de que o tribunal tinha de incluir a "jurisdição extraterritorial" de outros Estados.

Os 17 juízes, incluindo a portuguesa Ana Maria Guerra Martins, reconheceram que os países visados têm "controlo sobre as atividades públicas e privadas assentes nos seus territórios" que contribuem para a produção de gases com efeito estufa e que há compromissos de vários Estados, incluindo Portugal, para a redução de emissões, nomeadamente o Acordo de Paris (assinado em 2015 e que prevê a redução de emissões).

Ainda assim, o TEDH considerou que não poderiam servir de "base para a criação de uma interpretação jurídica sobre um terreno novo de jurisdição extraterritorial ou como justificação para expandir as atuais".

Os requerentes arguíram que um processo de violação dos direitos humanos por consequência das alterações climáticas não tinham cabimento para avaliação por uma instância em Portugal, mas o TEDH refutou o argumento, justificando que houve falta de prova apresentada em tribunais nacionais para ser objeto de análise pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos.

O tribunal interpretou que processos referentes ao ambiente e às alterações climáticas já estão presentes na moldura judicial portuguesa e são "uma realidade no sistema legal nacional", razão pela qual o processo devia ter esgotado todas as instâncias nacionais possíveis, antes de ser remetido para um tribunal europeu.

"O tribunal anotou que o sistema legal português providencia tanto os mecanismos para ultrapassar a falta de representação [dos requerentes] e medidas para ultrapassar a morosidade dos procedimentos", por isso o TEDH "foi incapaz de considerar que havia razões especiais para excetuar os requerentes de um processo exaustivo nacional de acordo com as regras aplicáveis e os procedimentos disponíveis".

Pela mesma razão, consideram haver falta de dados para examinar o estatuto de vítima pedido pelos requerentes.

Ainda assim, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos fez um reconhecimento histórico: as alterações climáticas são um problema que os países "têm o dever" de abordar e encontrar medidas para mitigá-las.

 

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