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O Poder de Capacitar os Refugiados

22-06-2018 - Joseph Munyambanza

Numa pequena comunidade da linha do Equador, crianças de diversas origens frequentam o ensino numa das principais escolas de primeiro ciclo da região. A escola tem uma charanga, uma quinta, uma comunidade de artistas, micro-financiamento, bem como clubes literários e grupos de apoio para as vítimas de violência doméstica. Existe, inclusivamente, um programa de orientação para ajudar as raparigas afectadas por conflitos a prosseguirem os estudos.

Este paraíso do ensino não se encontra num país rico com recursos ilimitados; é um campo de refugiados situado no Uganda Ocidental. Não é financiado por fundos de ajuda externa, mas por refugiados que contam com um orçamento restrito. Além disso é um projecto que visa a capacitação dos refugiados em toda a parte.

Esta experiência ao nível do ensino dos refugiados teve início em 2005, quando eu e outras crianças vivíamos no acampamento de refugiados de Kyangwali, no distrito de Hoima (Uganda). Com pouca comida e acesso limitado aos cuidados de saúde, lutámos para sobreviver; o ensino formal estava fora de questão. No entanto, porque entendíamos que a educação era a chave para a prosperidade, ensinávamos uns aos outros o que podíamos. Os alunos mais velhos ensinavam os alunos mais jovens e todos trabalhavam para ganhar dinheiro para comprar livros didácticos e fardas.

Com o tempo, estas sementes de aprendizagem de base acabaram por transformar-se na CIYOTA, uma organização voluntária liderada por jovens que realiza acções de formação, bem como na escola COBURWAS, assim denominada devido aos países de origem das crianças presentes no campo de refugiados: República Democrática do Congo, Burundi, Ruanda e Sudão do Sul.

Actualmente, mais de 1 500 estudantes estão matriculados em escolas de primeiro ciclo fundadas pela CIYOTA e por antigos alunos da CIYOTA. Mais de 700 frequentaram a escola secundária e mais de 40 antigos alunos estão a prosseguir os estudos em graus avançados em universidades de todo o mundo. Os nossos diplomados foram premiados com bolsas da Fundação Mastercard pelas suas qualidades de liderança, consciência social e aptidão académica. Além disso, os antigos alunos frequentaram, inlcusivamente, a Academia de Liderança Africana, uma das escolas de formação mais proeminentes de África. Essa relação organizacional é particularmente importante, tendo permitido melhorar substancialmente a rede profissional da CIYOTA.

Muitos jovens africanos já beneficiaram da iniciativa da CIYOTA, porém, o nosso trabalho não acaba na porta da sala de aula. Porque entendemos que as crianças aprendem melhor quando têm por base sistemas de apoio sólidos, trabalhamos também com os pais e os membros da comunidade com vista a tornar o ensino uma prioridade mais elevada. Desta forma, esperamos alcançar ainda mais crianças com necessidade de beneficiar de um ensino de qualidade.

A nossa organização pode ter raízes humildes, porém, os nossos planos são ambiciosos. Queremos transformar África aumentando o acesso dos estudantes pobres ao conhecimento. Na nossa opinião, o acesso à escola é apenas o primeiro passo; queremos inspirar as crianças a tornarem-se líderes e empreendedores e a aplicarem os conhecimentos que aprenderam na escola para melhorarem as suas comunidades e os seus países. Enquanto refugiados, o nosso objectivo incidiu sempre sobre a capacitação através da auto-suficiência.

Contudo, mesmo os melhores planos requerem recursos significativos e a CIYOTA seria ainda apenas uma ideia se não fosse a generosidade dos outros. Por exemplo, durante um encontro ocasional há anos, conheci um angariador de fundos bem relacionado na Academia de Liderança Africana que nos ajudou a angariar 20 000 dólares americanos em capital de arranque. Além disso, o gabinete do Primeiro-Ministro doou terreno para que a CIYOTA pudesse cultivar bananas, milho e outros produtos para alimentar os alunos e gerar rendimentos.

Estes gestos são ainda mais notáveis dado o crescente número de refugiados que entram no Uganda. Actualmente, cerca de 1,5 milhão de pessoas deslocadas vivem no país e este número aumentará provavelmente com a intensificação dos conflitos regionais. Num momento em que outros países estão a afastar os refugiados, o Uganda está a abrir as suas portas.

Queremos que os jovens refugiados de todo o mundo se sintam inspirados pela nossa experiência. Os povos recentemente deslocados necessitam de apoio alimentar e de auxílio de emergência, contudo, quanto mais tempo os refugiados estão longe das suas casas, mais necessitam de acesso a instituições que permitam a autodeterminação. Com empregos, terrenos e escolas, os refugiados podem recuperar algo que perderam quando fugiram: a esperança. Se o mundo conseguir alguma vez alcançar o ensino de primeiro ciclo a nível universal, um objectivo a que a comunidade internacional se comprometeu há quase sete décadas, irá necessitar de muitas mais escolas como as nossas. Os programas de ensino geridos por refugiados em Kyangwali são exemplos do que pode acontecer quando os jovens recebem as ferramentas para gerir o seu próprio destino.

Joseph Munyambanza

Joseph Munyambanza is Executive Director of CIYOTA and a Mastercard Foundation Scholar.

 

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