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'Dividimos o palanque': brancos liberais e minorias lutam juntos pelo desarmamento

30-03-2018 - Lois Beckett

Minorias lutam há décadas pela regulamentação da indústria de armas, mas os aliados liberais brancos raramente apareciam para lutar ao seu lado. Os estudantes de Parkland fizeram um esforço conjunto para preencher essa "lacuna de empatia".

Não há dia nacional de protesto para marcar a morte do irmão de Edna Chavez. Assim como os adolescentes mortos em Parkland, Flórida, no mês passado, ele era um estudante do ensino médio quando foi baleado.

"Era um dia como qualquer outro, sol se punha em South Central", disse Chavez, 17 anos, à multidão de centenas de milhares de pessoas no acto March for Our Lives (Marcha por Nossas Vidas), em Washington, no sábado. "Ouvimos estouros, pensando que eram fogos de artifício. Não eram. Vi a pele do meu irmão ficar cinza”.

Chávez, hoje aluna do ensino médio, pediu à multidão que dissesse o nome de seu irmão. “Ricardo!”, gritaram. Quando ela parou, com lágrimas nos olhos, eles gritaram mais alto: “RI-CAR-DO! RI-CAR-DO!”

Os protestos de sábado em Washington e em várias partes do mundo marcam uma profunda mudança no debate sobre o controle de armas nos EUA.

Durante décadas, analistas políticos disseram que a recusa do Congresso em aprovar novas leis para armas devia-se a uma “lacuna de intensidade” entre a National Rifle Association (NRA) e os defensores do controle de armas.

Pesquisas mostram há muito tempo que a maioria dos americanos apoia leis mais rigorosas para controle de armas, mas esta maioria não se organizou, fez lobby, protestou ou votou com a mesma disciplina dos defensores do direito às armas, em número muito menor.

Mas a “lacuna de intensidade”, assim como o conceito de “ansiedade econômica”, é perigosamente vaga, um argumento que esconde mais do que revela.

Nunca houve uma “lacuna de intensidade” entre os membros da NRA e os jovens ativistas e pais dilacerados de Oakland, St Louis ou Miami. Durante décadas, com ou sem a atenção da mídia, a comunidade negra pressionou por um controle mais rígido da indústria de armas e por leis que mantivessem as armas longe das mãos de adolescentes e adultos em situações de risco.

Mas os americanos mais atingidos por mortes diárias por armas são uma minoria, e concentram-se em um número relativamente pequeno de distritos eleitorais.

Sozinhos, nunca tiveram os votos no Congresso para aprovar as leis de controle de armas que querem. Eles precisavam de aliados – os aliados dos subúrbios brancos liberais que, pelo menos em teoria, também apoiam leis de controle de armas mais rigorosas.

A “lacuna de intensidade” sempre foi uma “lacuna de empatia”, porque aqueles aliados suburbanos raramente apareciam para lutar pela vida de crianças negras – exceto quando suas próprias escolas e seus próprios filhos estavam ameaçados.

Ao trazer centenas de milhares de pessoas para Washington e várias cidades do mundo, os estudantes do Parkland mostraram que podiam fechar a “lacuna de intensidade” e convencer milhões de americanos a votarem, na eleição de 2018, em uma plataforma de controle de armas.

“Não votem neles!”, bradava a multidão de Washington. "Não votem neles!"

Mas os alunos da escola Marjory Stoneman Douglas também fizeram um esforço conjunto para fechar a “lacuna da empatia” – reconhecendo décadas de apagamento de ativistas negros e colocando-os no palanque, não como figura simbólica no final de uma longa lista de vítimas de tiroteios em massa, mas como vozes centrais do movimento.

Quatro diferentes ativistas de Chicago falaram na March for Our Lives em Washington, junto com jovens ativistas negros de DC, Brooklyn e de subúrbios da Virgínia.

“Dividimos o palanque hoje e sempre com aqueles que sempre encararam o cano de uma arma”, disse à multidão Jaclyn Corin, aluna de Stoneman Douglas e uma das organizadoras do evento.

Crianças do subúrbio afetadas pela violência armada geralmente são tratadas como vítimas inocentes. Jovens americanos negros que são baleados são culpados por seu comportamento e responsabilizados por terem se tornado alvos. Mas na Marcha de sábado, todos os jovens oradores foram apresentados da mesma maneira: como estudantes, como sobreviventes, e como um poderoso desafio ao status quo político.

Enquanto Edna Chávez falava, alguns de seus colegas, jovens ativistas da Los Angeles’ Community Coalition, sentaram-se no palco com ela, observando a reação da multidão com surpresa e orgulho.

"Ela tocou os corações e as mentes da multidão", disse Fernando Mosqueda, de 16 anos. Quando ele checava as redes sociais, "todos a estavam apoiando, mostrando seu amor e se vendo nela".

Não é assim que as pessoas costumam ver a South Central, disse Mosqueda. Quando ele está em casa, ele fica na defesa, preocupado que as pessoas olhem para ele e não vejam um estudante do ensino médio, ou um jovem ativista, mas um membro de uma gangue latina.

De repente, ele estava ouvindo uma manifestação nacional cantar o nome de uma das crianças negras mortas em um dia como outro qualquer em Los Angeles.

"Nunca tivemos tanta atenção", disse ele. "Ela finalmente conseguiu uma plataforma nacional".

Mosqueda e Hakim Johnson, 16 anos, disseram que ambos estão cautelosamente otimistas que o movimento atual consiga gerar alguma mudança.

Ouvir Jennifer Hudson cantando com um coro no fim da manifestação foi “como sinos sinalizando que as coisas não serão mais como são, que não temos que aceitar o que vem acontecendo dos anos 90 para cá, não temos que nos habituar à violência armada, não precisamos nos preocupar se alguém entrou com uma arma na escola, se alguém vai metralhar o quarteirão”, disse Johnson.

Mas ter um movimento nacional de controlo de armas que inclui as vozes e histórias de jovens negros é apenas o primeiro passo.

As soluções políticas que o movimento nacional tenta alcançar também têm que refletir os objetivos dos sobreviventes da violência armada diária – e algumas dessas soluções exigem uma abordagem muito diferente do que propõem os ativistas de Parkland, que se concentraram em proibir a propriedade civil de armas de uso militar e pentes de munição de alta capacidade, bem como fechar brechas no sistema de verificação de antecedentes.

"O controle de armas inclui a polícia?", tuitou Chance the Rapper, artista e activista de Chicago, no sábado à noite. "A polícia deveria ter ARs?"

Chávez e os jovens activistas de Chicago fizeram observações semelhantes: eles querem o controle de armas, mas também investimentos econômicos em suas comunidades, focados em "mudar as condições que fomentam a violência e o trauma", como Chavez explicou. Colocar mais policiais nas escolas para alimentar o fluxo da-escola-para-a-prisão não protegeria as crianças negras da violência.

"Em vez de fazer com que os estudantes negros se sintam seguros, continuam nos estigmatizando e criminalizando", disse Chávez. "Em vez [de polícia], deveríamos ter um departamento especializado em justiça restaurativa."

Para os activistas negros, certas abordagens das leis de controle de armas também são consideradas prejudiciais.

“O primeiro passo é remover as armas, sem criminalizar pessoas que possuem armas”, disse Mosqueda. “O encarceramento em massa já é grande demais. Abusivo demais. Precisamos ter certeza de que estamos usando táticas cuidadosas, para remover as armas efetivamente, mas sem mandar as pessoas para a cadeia.”

Tradução de Clarisse Meireles

Publicado originalmente no The Guardian

Fonte: The Guardian

 

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