Sem consenso com Trump
16-12-2016 - Robert Kuttner
Alguns Democratas esperam trabalhar com o presidente eleito algumas questões como comércio e infraestrutura. É algo quase delirante.
Depois de quase duas semanas, isso é o que sabemos sobre o presidente eleito, Donald Trump. Ele está tratando a presidência como uma oportunidade para o nepotismo e para o enriquecimento pessoal. Seus primeiros compromissos sinalizam que o teor de extrema-direita de sua campanha continuará na sua presidência, bem como o fato de que ele está fora da sua intensidade.
Contra esse histórico, alguns Democratas estão com esperança de que ao menos haja alguns pontos de convergência. Esse é um grande erro.
O presidente Obama espera que possa ainda talvez ensinar Trump sobre as realidades da presidência. Esse será o episódio final do aspecto mais decepcionante da administração de Obama – colocar expectativas em um consenso sobre realidades terríveis que acima de tudo precisam de seriedade.
Obama ainda está no jogo, e Trump vai jogar junto somente até ele achar Obama uma peça útil para “normalizar” essa transição. Não será um pupilo.
Alguns Democratas, do mesmo modo, parecem achar que existem áreas de consenso, especialmente nas áreas de comércio e política de comércio e infraestrutura. Isso é algo quase delirante.
Jennifer Steinauer do New York Times escreveu uma matéria enganosa na semana passada, aparentemente incitada por uma conversa com Chuck Schumer, agora líder dos Democratas no Senado. Segundo Steinauer, os Democratas estão alinhados procurando por oportunidades para trabalhar com Trump e de alguma maneira tirá-lo dos Republicanos.
Sonho. É uma coisa declarar que se Trump realmente apoiar políticas que ajudem os trabalhadores, os Democratas trabalharão com ele. Outra coisa é acreditar que ele apoiará.
Peguemos o caso do comércio. Existem três áreas onde o programa Trump tem alguma semelhança com o que os Democratas progressistas há tempos criticam sobre a agenda corporativa e bipartidária.
O Camp Trump assinalou que a nova administração fará três iniciativas chave. Primeiro, suspenderão negociações sobre a Parceria Trans-Pacífica (TPP), o caso mais recente de acordo de comércio que serve principalmente a interesses corporativos e que não se refere ao trabalho e o meio ambiente.
Segundamente, irão estigmatizar a China como manipuladora da moeda.
Em terceiro lugar, eles aconselharão o México e o Canadá de suas intenções em revisar o NAFTA.
Então do que não gostamos? Muito, na realidade.
Para início de conversa, haverá uma retirada grande das elites corporativos e da liderança congressional Republicana. Uma TPP revisada poderia ser um Frankenstein, com nacionalismo econômico suficiente para irritar aliados mas muitos prêmios corporativos escondidos nas entrelinhas, e nada para os trabalhadores norte-americanos. Bem como um NAFTA revisado.
Na China, já passou da hora de uma política mais dura dos EUA nas políticas mercantilistas da China que subsidia a produção doméstica e suborna ou obriga os produtores norte-americanos a se deslocarem para a China. Mas pressionar a China para mudar suas políticas é um negócio muito delicado. Funcionou para adultos, não para manipuladores ignorantes de símbolos.
Trump também foi arrogante sobre ameaçar tarifas retaliatórias, e não somente contra a China. Se Trump bagunçar isso, podíamos acabar com uma destruição mútua assegurada do crescimento econômico e sem ganhos para a manufatura e os trabalhadores dos EUA.
Precisamos de um regime mundial de comércio muito diferente – um que permita que as nações protejam os padrões ambientais e de trabalho, a má conduta corporativa, e que tenha políticas industriais sem que seja taxado de violador do livre-comércio. Mas essa visão progressista de comércio é diametralmente o oposto do que Trump deve avançar.
Ainda não sabemos ao certo, porque o pessoal de Trump ainda está aprendendo.
O risco é que os primeiros passos de Trump – anunciando a renegociação do NAFTA, suspendendo a TPP, e taxando a China como manipuladora da moeda – produzirão aplausos relutantes dos Democratas, porque de primeira eles alteram negócios de sempre.
É provável que o nacionalismo econômico do estilo Trump seja diferente de livre comércio – mas sim uma forma de nacionalismo que sirva às corporações, não aos trabalhadores. É de se esperar que Trump cobre alguns favores de CEOs corporativos e traga de volta alguns empregos de alta-patente – o equivalente à farsa de “missão cumprida” de George W. Bush no Iraque.
À curto prazo, ele pode parecer bem mas as políticas reais morderão a isca e mudarão para o que é a marca registrada de Trump. Os Democratas seriam inteligentes de se manterem afastados até que vejamos quais serão as políticas reais.
E aí temos o caso da infraestrutura, há tempos uma causa dos Democratas progressivos. Aqui novamente, a versão do Trump de um programa de infraestrutura não serão investimentos públicos genuínos. Serão em sua maioria créditos fiscais para os negócios investirem em projetos de infraestrutura, combinados com uma privatização acelerada que entrega bens públicos.
À curto prazo, isso poderia produzir ganhos políticos para Trump. Poderia até mesmo produzir alguns empregos, mas nada como aqueles produzidos por verdadeiros investimentos públicos. Aqui novamente, mesmo com alguma semelhança superficial à coisa verdadeira, os Democratas seriam inteligentes em se afastar.
O presidente Obama gastou oito anos dolorosos procurando por um consenso com os Republicanos que desdenhavam de quaisquer esforços somente para destruir Obama. E eram os políticos de direita normais, não os neo-fascistas. Se não havia consenso com Paul Ryan e Mitch McConnell, certamente não haverá com Donald Trump.
Fonte: THE AMERICAN PROSPECT
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