09-08-2024
CAMBRIDGE – Com históricas ondas de calor assolando os Estados Unidos e outras partes do Hemisfério Norte, prevê-se que Junho seja o 13.º mês consecutivo de temperaturas globais recordes. A principal causa, por certo, é a enorme quantidade de gases com efeito de estufa (GEE) na atmosfera. Apesar da ameaça existencial representada pelo aumento das concentrações atmosféricas de GEE, as emissões continuam aumentando a um ritmo mais rápido do que o anteriormente previsto.
Por um lado, entretanto, o progresso na luta contra as alterações climáticas excedeu as expectativas. No meio da mudança global dos motores de combustão interna para veículos eléctricos (VE) e acelerada adopção de energia solar e eólica, a procura de energias renováveis está aumentando rapidamente nos EUA e na União Europeia.
Esse aumento na demanda foi alimentado por significativas quedas nos preços reais dos painéis solares, turbinas eólicas, baterias e veículos eléctricos. Nos EUA, isso pode ser atribuído, em parte, aos subsídios às energias limpas incluídos na Lei de Redução da Inflação do Presidente Joe Biden e, mais significativamente, às importações chinesas de baixo custo.
De forma alarmante, as novas tarifas impostas pelos EUA e pela UE sobre importações de painéis solares, veículos eléctricos e outros equipamentos ameaçam inviabilizar esse progresso. Embora estimar o custo da transição para energias limpas seja uma tarefa difícil, mesmo conceitualmente, prevê-se que o sector eléctrico global, por si só, exija US $3.5 triliões em investimentos de capital anualmente entre 2021 e 2050. Os países ocidentais exigiram que a China pague a sua cota justa desses custos, porém suas próprias políticas comerciais estão em total conflito com seus objectivos.
Embora o desproporcional direcionamento às importações de tecnologias limpas da China remonte há mais de uma década, a tendência acelerou significativamente sob o antigo presidente dos EUA, Donald Trump, e continuou sob Biden. Em Maio, a administração Biden impôs uma tarifa de 100% sobre veículos eléctricos chineses, juntamente com novas taxas sobre uma série de outros produtos chineses, incluindo células solares e baterias de íons de lítio.
Essas medidas visam proteger os trabalhadores americanos e as indústrias nacionais fundamentais. Mas correm o risco de minar a agenda climática do governo, especialmente os esforços para aumentar a quota de energias renováveis para 100% da electricidade dos EUA até 2035 e a quota de VEs para 50% das vendas de automóveis novos até 2030.
As novas tarifas dos EUA poderão estender-se para além das fronteiras nacionais da China. Em resposta às tarifas ocidentais, alguns fabricantes chineses mudaram-se para o Sudeste Asiático nos últimos anos. No início deste mês, a Comissão de Comércio Internacional dos EUA decidiu investigar as alegações de empresas americanas de células solares que procuram impor direitos compensatórios e anti-dumping aos fabricantes do Sudeste Asiático. Esta decisão surge apesar da oposição dos desenvolvedores de energia solar dos EUA, que dependem de equipamentos importados para a produção nacional.
Entretanto, a Comissão Europeia impôs tarifas provisórias sobre VEs chineses depois de uma investigação de oito meses ter descoberto que a “ injusta subvenção ” da China à sua indústria de VE prejudica os concorrentes da UE. As novas tarifas da UE, embora não sejam proibitivas, são em média de 31%, o que é substancialmente mais elevado que os direitos sobre as importações de automóveis convencionais de outros parceiros comerciais.
É certo que, embora os custos trabalhistas historicamente baixos e as economias de escala tenham ajudado a reduzir o preço dos painéis solares e dos veículos eléctricos chineses, os generosos subsídios governamentais – muitas vezes sob a forma de crédito barato – também desempenharam um importante papel. Mas ainda não está claro como é que o bloqueio dessas importações de baixo custo, como propõem muitos políticos ocidentais, beneficiaria os trabalhadores e os consumidores nos EUA e na UE. Será que os decisores políticos americanos e europeus preferem que seus próprios contribuintes, em vez dos cidadãos chineses, suportem os custos dos subsídios às energias limpas? Lembrem-se que os países ocidentais queriam que a China pagasse sua quota justa na transição energética.
É certo que a promoção de políticas climáticas, enfatizando seu potencial para criar empregos verdes para os trabalhadores locais, poderia ser uma eficaz estratégia política. Mas deveríamos reconhecer que esses argumentos são políticos e não económicos.
Embora as tarifas dos EUA possam ajudar a criar empregos na indústria de painéis solares, estas seriam compensadas pela perda de empregos no sector de instalações de energia solar, que depende de equipamentos de baixo custo. Da mesma forma, alguns empregos na produção de VEs desapareceriam se as tarifas levassem a preços mais elevados para as importações de baterias. Entretanto, muitos empregos de exportação seriam cortados quando a China e outros países inevitavelmente retaliassem contra as restrições ocidentais.
Com o desemprego nos EUA a 4%, decisores políticos e eleitores estão actualmente mais preocupados com a inflação do que com o emprego. A remoção das tarifas é a forma mais segura de os governos ocidentais baixarem os preços da energia e dos transportes, reduzindo assim a inflação. Este é mais um exemplo de como o comércio internacional poderia reduzir os custos da transição para energias limpas – caso o adoptássemos
JEFFREY FRANKEL
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Jeffrey Frankel, Professor de Formação e Crescimento de Capital na Universidade de Harvard, desempenhou funções como membro do Conselho de Consultores Económicos do Presidente Bill Clinton. É investigador associado do National Bureau of Economic Research dos EUA. |