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COMO É QUE A EUROPA PODE CONCRETIZAR O PACTO ECOLÓGICO
Autor: Simone Tagliapietra

07-06-2024

BRUXELAS – Desde que o Pacto Ecológico Europeu  foi apresentado em 2019, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, tem-no promovido como a nova agenda de crescimento económico da União Europeia. Afinal, embora o objectivo central da estratégia esteja relacionado com o clima – reduzir as emissões de gases com efeito de estufa da UE para zero emissões líquidas até 2050 – ele pretende alcançá-lo através da modernização da economia e da promoção da inovação. Mas nem toda a gente está convencida.

Nos últimos meses, os automobilistas europeus queixaram-se da proibição iminente  da produção e venda de automóveis com motores de combustão interna, os agregados familiares resistiram aos planos de eliminação gradual  das caldeiras a gás e os agricultores revoltaram-se  contra as regulamentações ambientais que consideram prepotentes. Com a aproximação das eleições para o Parlamento Europeu, no próximo mês, os partidos de extrema-direita “atropelam-se” para se imporem como os acérrimos defensores oficiais deste descontentamento crescente e preparam-se para usar todo o poder que ganharem para sabotar a agenda verde.

Os manifestantes têm razão em alguns pontos. A transformação radical que o Pacto Ecológico Europeu implica levanta questões difíceis sobre quem deve suportar os custos da ação climática, tanto a nível nacional como entre países. Se esses custos acabarem por recair de forma desproporcionada sobre os trabalhadores comuns – sem falar nas comunidades mais pobres e vulneráveis – a transformação exacerbará a desigualdade, com efeitos de dominó potencialmente graves a nível social e político. Felizmente, políticas climáticas correctamente concebidas podem evitar esse resultado e conduzir, efectivamente, a uma maior igualdade social.

O Pacto Ecológico Europeu teve em conta considerações de justiça climática desde o início. O Pacto Ecológico Europeu teve em conta considerações de justiça climática desde o início. Os defensores do Pacto sempre souberam que teriam de garantir o apoio político da Polónia, país com utilização intensiva de carvão, e não esqueceram a revolta dos “coletes amarelos” que eclodiu em França em 2018, depois de o presidente  Emmanuel Macron ter tentado impor um imposto sobre o carbono nos transportes rodoviários.

Não é coincidência que a primeira iniciativa emblemática do Pacto Ecológico Europeu tenha sido o Fundo para uma Transição Justa, que irá destinar 20 mil milhões de euros (21,6 mil milhões de dólares) em 2021-27 ao apoio  da “diversificação e reconversão económica” dos territórios, à partida, mais afectados de forma negativa pela transição ecológica. Também não é coincidência que, ao mesmo tempo que criava o primeiro  mercado de carbono  para os edifícios e os transportes rodoviários, a Comissão Europeia tenha criado o Fundo Social para a Ação Climática , que deverá mobilizar pelo menos 86,7 mil milhões de euros entre 2026 e 2032 para compensar os grupos mais vulneráveis pelo aumento dos preços da energia.

Estas iniciativas políticas reflectem os conselhos que se podem encontrar na literatura económica sobre dividendos de carbono. Mas revelar-se-ão insuficientes para contrabalançar os profundos efeitos distributivos da política climática, sobretudo à medida que a descarbonização acelera e inclui sectores que afectam directamente a vida quotidiana das pessoas comuns, como os edifícios e os transportes. É por isso que a Europa também precisa de um novo contrato social verde, que se concentre principalmente nesses sectores.

Para o efeito, a UE deve dinamizar e simplificar os instrumentos de financiamento existentes, a fim de prestar um apoio ainda mais decisivo à transformação das regiões que utilizam carvão e carbono de forma intensiva. Deve também tomar medidas para garantir que os países da UE utilizem melhor e de forma mais específica as receitas do mercado do carbono para apoiar a adopção de alternativas ecológicas, desde os veículos eléctricos até aos sistemas de aquecimento doméstico. Além disso, deve promover um “Acordo Verde Rural” que apoie os pequenos agricultores e exija, simultaneamente, que a indústria agro-alimentar transforme os seus sistemas. Embora uma acção deste tipo a nível da UE não elimine as consequências distributivas da política climática, ajudaria significativamente.

A UE também tem de transformar a descarbonização numa verdadeira oportunidade económica, desenvolvendo uma política industrial verde sólida. Para tal, será necessário, antes de mais, revitalizar a “monótona” agenda do mercado único da UE, a fim de tirar partido do maior trunfo do bloco – um enorme mercado partilhado de bens, serviços financeiros, energia, trabalhadores e ideias – para incentivar novos investimentos em tecnologia limpa.

Serão igualmente necessárias intervenções em domínios tecnológicos específicos. Em vez de imitar a ampla Lei de Redução da Inflação  dos EUA, a UE deve tirar o máximo partido dos seus recursos limitados, prestando apoio específico nos domínios em que já dispõe de uma sólida vantagem comparativa na qual se possa basear. Embora algumas indústrias já estabelecidas possam precisar de apoio à medida que forem abandonando o carbono, o objectivo principal deve ser o apoio a inovações revolucionárias.

O Pacto Ecológico Europeu percorreu um longo caminho desde a sua concepção, há cinco anos. Mas se a UE quiser atingir os seus objectivos climáticos para 2030 e alcançar as zero emissões líquidas até 2050, tem de agir agora para garantir que consegue enfrentar os inevitáveis ventos contrários políticos. Um novo contrato social ecológico e uma nova política industrial podem fazer toda a diferença.

SIMONE TAGLIAPIETRA

Simone Tagliapietra, pesquisadora sénior do think tank Bruegel, com sede em Bruxelas, é professora adjunta na Escola de Estudos Internacionais Avançados da Universidade Johns Hopkins, em Bolonha.

 

 

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