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Um novo paradigma para os plásticos
Autor: Lili Fuhr, Jane Patton

15-03-2019

Temos conhecimento desde há muito tempo que a acumulação de plástico nos aterros e nos oceanos em todo o mundo representa um crescente risco ambiental. Mais recentemente, temos vindo a compreender que o plástico representa uma ameaça urgente - até mesmo fatal - à saúde pública, também. Além disso, no entanto, os esforços globais para enfrentar a crise dos plásticos permanecem constantemente centrados na extremidade errada do ciclo de vida: a gestão de resíduos.

O debate que será retomado neste mês na Assembleia das Nações Unidas para o Ambiente (ANUA-4) é um caso em questão porque vai concentrar-se no " lixo marinho e nos micro-plásticos". Estas questões são importantes, contudo, constituem apenas uma pequena parte de um problema muito maior.

Na verdade, o plástico tem desempenhado um papel essencial no crescimento económico mundial desde há décadas. As suas, aparentemente, inúmeras aplicações incluem dispositivos médicos para salvar vidas, roupas, brinquedos, vários usos industriais e agrícolas e assim por diante. Alguns têm mesmo apregoado o plástico como parte da solução para as alterações climáticas, argumentando, incorrectamente, que tem uma pegada de carbono menor do que outros materiais. Na verdade, o plástico liberta gases com efeito de estufa significativos como o metano e o etileno à medida que se decompõe na terra e nos ambientes marinhos.

De facto, 99% dos plásticos são feitos a partir de combustíveis fósseis como o carvão, o petróleo e o gás. Além disso, novas investigações demonstram que o plástico é prejudicial para o nosso corpo em todas as fases do seu ciclo de vida, desde a sua extracção como um combustível fóssil até à sua utilização como embalagem para alimentos e através do processo de gestão de resíduos (que inclui aterros, centros de reciclagem e incineradores).

De uma forma ou de outra, quase todos os organismos do planeta são afectados pela produção, pelo uso ou pelo descarte de plástico, cujos efeitos tóxicos mantêm-se e acumulam-se incessantemente no ar que respiramos, na água que bebemos e no solo sob os nossos pés. Alguns dos principais impactes da produção de plásticos incluem danos nos sistemas reprodutivo e imunológico, no fígado e lesão renal e, inclusive, cancro; à medida que nos movemos através do ciclo de vida dos produtos plásticos, as ameaças aos sistemas reprodutivos e de cancro continuam com prejuízos adicionais para o desenvolvimento neurológico e outros sistemas. Para piorar as coisas, a produção de plástico está a aumentar e continuará a causar danos. O sector dos plásticos dos EUA, por si só, planeia aumentar a produção em 30% nos próximos anos.

Embora o público associe o plástico a materiais maravilhosos que salvam vidas, um número estimado de 40% da produção de plásticos a nível mundial tem como único fim as embalagens. Pela sua concepção, é usado temporariamente para o transporte e armazenamento e, em seguida, simplesmente mandado fora. Como resultado, quase 80% de todo o plástico alguma vez produzido acabou num aterro ou à solta no ambiente natural, apesar de anos de mensagens da indústria para incentivar a reciclagem. Não nos falta apenas a capacidade de reciclagem para gerir o plástico já em circulação; as recentes inovações na reciclagem parecem estar a causar ainda mais danos no ambiente e na saúde pública através da poluição do ar, das cinzas tóxicas e de outros factores exógenos.

Um debate que se concentre exclusivamente em torno dos resíduos serve perfeitamente a indústria dos plásticos. Durante anos, os produtores têm investido em campanhas de marketing e publicidade para convencer os consumidores de que eles próprios têm responsabilidade na crise dos plásticos. E eles e os seus representantes têm andado ocupados a persuadir os governos - incluindo os participantes na ANUA - que a gestão de resíduos deve ser o seu foco principal.

Até agora, estes esforços têm conseguido evitar medidas que limitem a produção e, consequentemente, os lucros. Quando a indústria gasta mil milhões de dólares americanos para lançar uma "Aliança para acabar com os resíduos de plástico" de grande importância, o seu objectivo real é manter o   status quo   e proteger o seu investimento de 200 mil milhões de dólares americanos em produção alargada nos próximos cinco anos.

Ainda assim, há razões para manter a esperança. Libertar-se do Plástico, um crescente movimento global de organizações não-governamentais, tem trabalhado para informar os governos e os seus representantes dos danos e dos riscos associados a uma nova produção de plástico. Nos 15 meses desde a ANUA-3, um Grupo Aberto de Peritos Ad Hoc reuniu-se duas vezes para avaliar as opções disponíveis para resolver a crise dos plásticos de forma holística. As suas descobertas, amparadas por várias análises patrocinadas pela ONU e por relatórios independentes, apontam para grandes lacunas e coordenação insuficiente nas estruturas de governação actuais.

As recomendações do grupo de peritos têm dado um impulso significativo à pressão para um novo quadro global para reduzir a produção e o consumo de plástico. Na ANUA-4, uma resolução apresentada pela Noruega apela ao reforço das estruturas da governança global para tratar o lixo marinho e os micro-plásticos. Porém, a esperança é que isto sirva como um primeiro passo rumo a um tratado juridicamente vinculativo com uma abordagem multi-camadas para a resolução do problema.

Uma nova convenção mundial para enfrentar a crise dos plásticos melhoraria a coordenação entre os governos e as estruturas regulamentares existentes e, além disso, forneceria o apoio técnico e financeiro. Mais importante ainda, o seu foco central seria impedir tanto o crescimento da poluição do plástico como dos danos à saúde humana em todas as fases do ciclo de produção.

Todos temos o direito de viver num ambiente saudável. No entanto, esse direito não estará protegido até que adoptemos medidas juridicamente vinculativas para limitar a produção dos plásticos e tornemos as empresas e os governos responsáveis pelos danos que o plástico faz aos nossos corpos, comunidades e ecossistemas. Educar as pessoas sobre a importância da reciclagem não é suficiente. Estamos optimistas que a ANUA irá reconhecer esta questão e juntar-se àqueles que já estão a liderar uma iniciativa inovadora para proteger a saúde humana e ambiental.

LILI FUHR

Lili Fuhr chefia a Divisão de Política Ambiental Internacional da Fundação Heinrich Böll.

JANE PATTON

Jane Patton, activista mundial anti-plástica, é a coordenadora interina para a região dos EUA do movimento Break Free From Plastic.

 

 

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