Relatório denuncia "promiscuidade" na saúde entre público e privado
22-06-2018 - Nuno Guedes
O Observatório Português dos Sistemas de Saúde revela que não estão identificados os médicos que trabalham no público e no privado. Inventário Nacional dos Profissionais de Saúde previsto na lei nunca foi feito.
O Estado não sabe que médicos trabalham no público e no privado, ao mesmo tempo. O alerta é do relatório anual do Observatório Português dos Sistemas de Saúde que reúne especialistas de várias universidades.
O documento fala numa crise nos cuidados hospitalares, de uma Lei da Saúde Pública que ainda não foi aprovada e de Cuidados de Saúde Primários com carências estruturais, mas também destaca um problema de recursos humanos que coloca em causa todo o planeamento: onde estão e onde trabalham médicos e enfermeiros?
O coordenador do capítulo sobre os recursos humanos explica que assim é difícil fazer qualquer diagnóstico sobre as necessidades que o país tem na área da saúde, havendo milhares de casos em que nem as ordens profissionais conseguem dizer onde andam médicos ou enfermeiros.
Tiago Correia diz que é óbvio que o Serviço Nacional de Saúde sabe a quantos paga, mas o problema é o que fazem ao certo os que trabalham no público e os que trabalham no privado.
Desde 2015 que a lei prevê que se faça um Inventário Nacional dos Profissionais de Saúde, mas a medida nunca saiu das intenções.
Um dos problemas é não se saber quem trabalha no público e no privado ao mesmo tempo, algo que para Tiago Correia é "bastante preocupante" pois o Serviço Nacional de Saúde acaba por não saber as razões que levam os recursos humanos a fazerem outras atividades.
Além disso, admite o investigador do ISCTE, "esta é uma das formas de perversão das relações público-privado na saúde em Portugal".
Ou seja, detalha Tiago Correia, "profissionais que deambulam entre público e privado o que faz, também, com que os doentes deambulem entre os dois lados em função das várias conveniências e raramente são as conveniências do Estado".
O coordenador do relatório na parte sobre recursos humanos na saúde defende, por isso, que para defender o SNS e garantir a igualdade entre as pessoas, evitando a "promiscuidade" e o "vai e vem" de profissionais e doentes, é preciso ter transparência.
Ordem dos Médicos recusa qualquer promiscuidade na saúde
O Bastonário da Ordem dos Médicos afasta qualquer irregularidade no exercício da profissão em simultâneo no setor público e privado. Miguel Guimarães estima que perto de 65% dos médicos que exercem no Serviço Nacional de Saúde também trabalham no privado, mas sublinha que a situação é perfeitamente legal.
Em declarações à TSF, o Bastonário diz ainda desconhecer o encaminhamento de doentes entre os hospitais públicos e privados, exceto os casos de alguns pacientes que iniciaram tratamentos oncológicos em unidades privadas e tiveram de ser trasnferidos porque o seguro não permite a continuação dos tratamentos. Miguel Guimarães reconhece que esta é uma situação desconfortável e sugere maior regulação.
Ainda assim, o Bastonário sublinha que se os casos de doentes que passam do setor público para o privado acontecem "o ministério da Saúde tem a faca e o queijo na mão" para combater o problema.
Fonte: TSF
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